Educar com culpa

Laura Sanches // Maio 20, 2025
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Educar com culpa
Educar com culpa

Vivemos tempos em que pode parecer cada vez mais difícil ser pai ou mãe de uma criança. O Burnout parental que nem existia até há pouco tempo atrás, hoje é uma expressão cada vez mais conhecida e usada e até já há estudos que demonstraram que uma boa parte dos pais se sente assoberbado pelo stress na maioria dos dias.

Muitos pais sentem-se extremamente culpados e há uma tendência para acreditar que precisam de se livrar da culpa para serem capazes de fazer bem o seu papel, quando isto não é verdade. 

A culpa aparece sempre que assumimos a responsabilidade de cuidar de alguém e se nos livramos dela também nos livramos dessa responsabilidade, que é precisamente o oposto daquilo que precisam os nossos filhos. Por isso, aquilo de que precisamos é de criar uma relação com ela e um espaço para que ela exista dentro de nós. Quando fazemos isto percebemos que ela também tem a sua utilidade, porque pode servir para nos guiar em direcção aos nossos valores, áquilo que é importante para nós. 

A culpa pode ajudar-nos a perceber se há alguma coisa que precisemos de corrigir e isto pode ser muito importante. 

Mas também é útil saber que ela pode aparecer mesmo em situações em que a culpa não é necessariamente nossa e por isso o mais importante é mesmo sermos capazes de a ver como o reverso da medalha daquilo a que Gordon Neufeld chama o instinto alfa: aquele que nos põe no lugar de cuidar e que nos faz assumir a responsabilidade de preencher as necessidades de outra pessoa, e que é fundamental para sermos capazes de educar qualquer criança que esteja aos nossos cuidados.

Os pais dos nossos dias estão cada vez mais isolados e uma boa parte deles não tem uma verdadeira rede de apoio para educar as crianças.

O facto da sociedade já não se organizar maioritariamente de uma forma hierárquica e o individualismo crescente que tem vindo a acontecer nas últimas décadas fazem com que os pais não tenham ninguém que cuide se si, enquanto cuidam dos filhos e isto também é um dos factores que pode contribuir para o desgaste parental.

Também estamos cada vez mais conscientes do impacto que têm as nossas acções no desenvolvimento das crianças e do impacto que a infância tem na construção dos futuros adultos, além de que o facto das famílias terem cada vez menos filhos também faz com que invistam cada vez mais na sua educação e isto faz que estejamos cada vez mais preocupados com o impacto das nossas acções e com a forma como queremos educar.

A proliferação de vários especialistas e até de influencers que nos dizem como devemos educar juntamente com a visão comportamentalista que ainda vigora na nossa cultura também não ajudam a que os pais se sintam seguros e confiantes no seu papel, algo que contribui para o aumento da ansiedade e dos sentimentos de angústia e até de desespero.

Emoções, instintos e a importância da relação entre pais e filhos

O comportamentalismo tende a desvalorizar o contexto em que as crianças são educadas e faz-nos acreditar que precisamos de fórmulas e ferramentas (que os especialistas dominam e vendem) para educar as crianças, fórmulas do tipo se fizer x acontece y. O problema é que as crianças não são seres isolados e o seu comportamento depende do contexto e, acima de tudo, das emoções. São as emoções que nos fazem agir e o comportamentalismo tende a apontar sobretudo à parte mais visível do icebergue, a que está a superfície, que é o comportamento e esquece-se que é o que está por baixo que tem mais peso: as emoções e instintos.

Esta visão também faz estragos quando recomenda aos pais que ignorem os seus instintos e que desvalorizem o contexto mais importante em que as crianças crescem: a relação com os adultos que cuidam de si. É esta relação que molda todo o seu desenvolvimento e é nela que está a base para o amadurecimento da criança. Então tudo aquilo que fizermos para educar uma criança precisa de ter por base esta ideia de que é através da relação que podemos educar e precisamos de ter em conta como é que o nosso comportamento influencia e tem impacto nessa relação.

Educar com culpa

No livro “Educar com Culpa” descrevo a importância dos pais serem capazes de recuperar o seu instinto alfa e como podem usá-lo para tornar mais fácil a tarefa de educar os seus filhos.

Uma criança que é educada por adultos que sabem ocupar esta posição de cuidar também será uma criança que cresce mais tranquila e segura, com mais probabilidades de amadurecer e de desenvolver todo o seu potencial. 

É um livro em que também falo da importância de desenvolvermos uma cultura que valorize mais a brincadeira porque é a brincar que as crianças podem realmente amadurecer. E as crianças dos nossos dias têm cada vez menos tempo e espaço para brincar, porque os ecrãs vieram roubar muito desse espaço, mas também porque os adultos confiam e compreendem cada vez menos o valor da brincadeira livre que praticamente desapareceu da vida das nossas crianças. 

Preservar o espaço para a brincadeira livre

É importante termos noção de que é a brincar que as crianças podem aprender e desenvolver praticamente todas as competências de que precisam para a sua vida. E, como adultos, precisamos de encontrar forma de preservar esse espaço de brincadeira nas suas vidas, mantendo-as longe de ecrãs, mas não só. Para que as crianças se sintam verdadeiramente livres para brincar, também precisamos de confiar na importância da brincadeira, mas também da relação, porque as crianças precisam de sentir-se seguras para serem capazes de brincar de verdade. 

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