Em algum momento da nossa vida, vivenciamos situações que podem ter um impacto profundo a nível emocional, condicionando a nossa forma de ser, estar e pensar sobre nós próprios, os outros e o modo como vivemos o nosso futuro. A isso chamamos de traumas, que podem ser mais ou menos profundos, mais antigos ou mais recentes, mais explícitos ou até permanecerem no nosso inconsciente, mas que interferem de forma desestruturante no nosso bem-estar.
Traumas de infância e feridas emocionais
Os traumas, bem como as feridas emocionais, podem ocorrer em várias fases da nossa vida. Muitas das situações mais impactantes são as que aconteceram logo na infância, nomeadamente nos primeiros anos de vida, tendo um prognóstico mais reservado quando não são diagnosticadas e resolvidas/tratadas. Uma vinculação frágil com a mãe, nos primeiros meses de vida, poderá comprometer todo o desenvolvimento emocional, com relação direta na autoestima e na forma como nos relacionamos com os outros. Podemos criar a falsa crença de que não somos dignos de amor, o que se materializa em trauma. Essas crenças limitam-nos muito para além dos relacionamentos sociais, afetando até a forma como nos reconhecemos como incapazes, por exemplo, na vida profissional.
Quando o trauma se torna patológico
Qualquer que seja a circunstância ou o sintoma, torna-se patológico a partir do momento em que condiciona os nossos hábitos e rotinas, quer a nível familiar, social, profissional ou no autocuidado.
Por vezes, existem gatilhos emocionais — como uma atitude, uma palavra, um gesto — que nos desencadeiam sensações de mal-estar e nos desorganizam emocionalmente. Nem sempre os conseguimos identificar ou relacionar com o trauma que temos registado na nossa memória, sobretudo a memória afectiva.
A origem e a percepção do trauma
Infelizmente, os traumas não obedecem a um catálogo que ajude a diagnosticá-los. São muito variados e podem ter diversas origens. Muitas vezes são pequenos acontecimentos, vividos até em grupo, mas que impactam de forma diferente cada indivíduo, correndo-se o risco de desvalorizar a dor do outro. As consequências desses acontecimentos dependem diretamente das características de personalidade individuais, do suporte social e familiar, da fase da vida, da idade e, sobretudo, da maturidade emocional. Também importa a forma como a pessoa se posicionava anteriormente em relação à sua capacidade de lidar com desafios e adversidades. Por isso, o trauma assume várias dimensões consoante o sujeito.
Prisioneiros da dor
Muitas vezes esquecemo-nos de viver porque a dor e o medo nos limitam. Ficamos prisioneiros dos traumas que se tornam cicatrizes na nossa mente e nos impedem de encontrar estratégias de superação. No entanto, cada um de nós possui ferramentas internas que podem ser potenciadas pela família, amigos e até por profissionais de saúde mental, para lidar com essas experiências que poderão tornar-se traumáticas quando não são resolvidas.
A possibilidade de reescrever a nossa história
Temos a capacidade de (re)escrever a nossa história, decidirmos a narrativa e tornarmo-nos a personagem principal. Viver na vitimização, por vezes, dá-nos alguns benefícios que nos mantêm “confortáveis” no sofrimento. Parece um paradoxo? Pois… poderá parecer, mas, na realidade, a dor e o sofrimento podem trazer-nos os chamados benefícios secundários: mais atenção de quem amamos, mais motivos plausíveis para procrastinar… Pode ser confortável para situações que anteriormente preferíamos não enfrentar (por exemplo, não ter muitos contactos sociais, faltar ao emprego…), porque, de facto, temos uma situação que implica na nossa saúde mental e que serve de justificação para “não vivermos”.
O segredo está em “desmontar” esses acontecimentos, para que não condicionem as oportunidades de vivermos a vida em pleno. Por vezes, é uma tarefa árdua, que implica dor, mudança e iniciativa. Nem sempre somos capazes de o fazer sozinhos, mas isso não é uma fragilidade. Antes, é uma estratégia na busca de solução, que nos retire do remoinho do sofrimento e nos fortaleça e capacite para a adversidade.
A felicidade na vida real
As vidas felizes só existem no mundo dos unicórnios com purpurinas e fadinhas. Na vida real, somos postos à prova e podemos fortalecer-nos para enfrentar os desafios, sermos mais capazes e, consequentemente, mais felizes.
Lembre-se desta frase do meu livro, que considero inspiradora:
Descanse o coração. Ele bate com força para fazer viver, não para desistir!”
