Relações familiares tóxicas

Diana Gaspar // Outubro 21, 2024
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relações familiares tóxicas
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Família significa vínculo seguro, respeito, suporte emocional e crescimento, sendo por tudo isto que significa ser um espaço de amor, onde nos sentimos seguros para crescer, onde as nossas necessidades de crescimento são respeitadas e satisfeitas, e onde sentimos que podemos ser nós, em aceitação e liberdade. É na família que iniciamos a construção da nossa identidade, que criamos os nossos modelos relacionais e definimos como nos vamos começar a relacionar connosco e com os outros. Por outro lado, também é na família que descobrimos quem somos, para onde vamos e com quem vamos, pelo menos até nos tornarmos autónomos e independentes. 

Viver em família é complexo sem qualquer dúvida, mas também é a experiência mais marcante e bonita das nossas vidas. Sabemos, no entanto, que nem sempre a experiência familiar é saudável e construtiva, podendo assumir também contornos de abuso e de toxicidade. 

Não são só as famílias claramente disfuncionais – onde estão presentes vários tipos de violência, dependências, violação de limites e onde os membros estão em riscos emocionais extremos – que impactam negativamente a saúde mental dos seus envolvidos – mas também nas famílias que assumem padrões  tóxicos, que podendo não ser tão visíveis aos olhos de todos, assumem de igual forma consequências muito negativas no desenvolvimento dos mais vulneráveis. Para clarificar padrões familiares tóxicos, deixo alguns exemplos, podendo algumas famílias ter mais do que um ou apenas um dos seguintes exemplos.

Dinâmicas familiares tóxicas:

  • centradas na crítica, comparação e no perfeccionismo constante;
  • onde mais do que comunicar apenas se fala do trivial, supérfluo e dos afazeres e não se pode partilhar problemas, dificuldades e perspectivas diferentes para não se criar algum tipo de conflito ou discussão;
  • onde as regras, ou não existem (arbitrárias e inconsistentes) ou são extremamente rígidas sem espaço para a autoexpressão individual de cada membro da família;
  • onde não há receptividade a novas ideias, necessidades e formas de viver; 
  • onde se usa a manipulação como forma de persuadir escolhas e comportamentos;
  • onde se vive em função de um elemento narcísico (mãe ou pai);
  • onde os comportamentos não são previsíveis e nunca se sabe bem com o que contar; 
  • onde se vive em função da aparência e da opinião social; 
  • onde se sente medo e vergonha em se expressar o que se sente e pensa; 
  • onde não há espaço para o erro e a independência individual consequência do crescimento é assumida como falta de lealdade pela família;
  • onde o controlo é máximo e o espaço para cada um se expressar é mínimo. 

Se se identifica com algum dos pontos mencionados, poderá estar num contexto familiar tóxico. 

A toxicidade na família pode estar mais presente do que aquilo que muitas vezes conseguimos imaginar.

Isto é o que acredito e digo-o, porque vou percebendo que alguns comportamentos e escolhas que são vistas como normais, são na verdade bem tóxicos. E são tóxicas porque nos fazem sentir mal, anulados e castrados na forma como nos expressamos e vivemos

Muitas vezes sentimos que não estamos a viver a nossa vida mas a vida que desenharam para nós e que nos obrigaram a viver, pela ideia alimentada que a família pode tudo, tornando-nos assim, reféns de um nome de família, legado ou estatuto. E muitas vezes, tudo isto, faz-nos sentir vergonha por sermos tão diferentes dos demais, rejeitados, uma desilusão, não pertencentes e que por tudo isto não somos dignos de amor. 

Quando crescemos a sentir que o amor que recebemos é uma moeda de troca cumprida por uma série de requisitos, então estamos num contexto familiar tóxico. E às vezes é muito duro perceber e ganhar consciência sobre esta realidade. 

No entanto, se tudo isto nos parece difícil de ultrapassar enquanto somos crianças e jovens, quando somos adultos podemos e devemos fazer ouvir a nossa voz interior, voz essa, que precisará de se reconstruir e libertar de toda a toxicidade que terá desde a sua construção. Acredito que, quando nos tornamos adultos, também ganhamos uma capacidade maior para nos protegermos, esclarecermos e trazermos a nós a força da adultez, com a intenção de nos libertarmos de tudo o que nos faz muito mal, deprime, anula e retira vida e liberdade. 

Por acreditar que todos os movimentos de libertação da toxicidade devem ser feitos por caminhos de paz, acredito que mais do entrar em guerra com a família para que eles mudem ou nos aceitem como queremos ser, o mais importante é que cada um, para si e consigo, perceba o que precisa de fazer para se transformar e recomeçar com conhecimento que já tem. 

É tão tóxico sermos educados de forma tóxica como é vivermos uma vida a culpar os pais ou a restante família por tudo o que vivemos. 

A culpa, a vitimização, a vergonha e a insegurança retiram confiança, poder pessoal e a coragem implícita em qualquer processo de mudança. E se enquanto crianças fomos indefesos, vulneráveis e permeáveis a tudo o que chegava até nós, enquanto adultos podemos desenvolver outro tipo de competências, redefinir e descobrir a nossa verdade, e recomeçar as vezes necessárias até nos libertarmos de forma cada vez mais consciente de todo o tipo de toxicidade

A infância tem um poder muito grande em quem fomos e somos até ao momento em que queremos ser e fazer diferente. 

Se os modelos relacionais que nos moldaram não foram os mais saudáveis e não gostamos deles, também enquanto adultos que somos, temos a capacidade de parar, questionar e redefinir as vezes necessárias com paciência, amor, perdão e centrados na relação que queremos criar dentro de nós connosco e que queremos construir fora de nós

Negar o nosso poder de mudança é negar a reconstrução da nossa vida para continuarmos a ser apenas uma continuação dos modelos familiares onde crescemos. 

A má notícia de tudo isto, é que dá imenso trabalho, a boa, é que vale imensamente a pena!

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