Vivemos hoje num ritmo acelerado e emoções como o stress e a ansiedade surgem com frequência. Na tentativa de encontrar um alívio ou algum prazer, muitas pessoas encontram na comida o seu escape – porque realmente comer é um dos maiores prazeres da vida. No entanto, a comida não vai eliminar esta emoção, vai apenas suprimi-la temporariamente. Assim, continuamos sem saber lidar com o stress e o ciclo persiste, com a agravante da culpa e do arrependimento que se seguem – porque nestes momentos de desconforto procuramos refúgio em alimentos como o chocolate, bolachas ou outros com bastante açúcar e gordura. Nunca se ouviu ninguém num momento de stress desejar comer brócolos ou couve-flor, certo?
Este tipo de comportamento – comer para aliviar o stress – representa a nossa fome emocional.
É importante deixar claro que todos nós somos, em graus diversos, “comedores emocionais” porque procuramos afeto, memórias, conforto e prazer sensorial na comida.
A diferença entre a fome emocional saudável e a não saudável é a frequência e a intensidade com que esse “comer emocional” acontece. É como um espectro que vai desde a cor verde (saudável) à cor vermelha (não saudável).
É um sinal de alerta quando a nossa relação com a comida é predominantemente marcada pela fome emocional, ou seja, quando acontece de forma intensa e frequente no dia-a-dia.
Nestas situações, pode por um lado levar a restrições severas, dietas rígidas e fobias alimentares, e por outro lado ao exagero alimentar. Portanto, a fome emocional, pode mesmo contribuir para a obesidade, para a falta de estratégias para a regulação emocional, para um comportamento alimentar perturbado, e em casos mais graves a uma perturbação do comportamento alimentar, como a compulsão alimentar (que é o extremo mais grave da fome emocional).
Para controlarmos a fome emocional é fundamental adotarmos diferentes estratégias, não só a nível alimentar, mas também ao nível do nosso comportamento alimentar.
O comportamento alimentar é o que acontece mesmo antes da escolha do que vamos comer e quanto vamos comer. É construído a partir do que acreditamos, pensamos e sentimentos em relação à alimentação e do que conhecemos em relação à alimentação.
Uma das ferramentas importantes para trabalhar a mudança do comportamento alimentar é a Terapia Cognitiva Comportamental.
Esta técnica analisa a relação entre os nossos pensamentos, sentimentos e comportamentos. Uma pessoa comporta-se de determinada maneira consoante aquilo que pensa e sente perante determinada situação da vida e com isso constrói diferentes hipóteses sobre o futuro e sobre a sua própria identidade.
De acordo com esta técnica, “as nossas emoções e comportamentos são determinados pela forma como interpretamos o acontecimento”. Ou seja, somos nós que atribuímos significado a tudo à nossa volta – às pessoas, aos sentimentos e até ao que nos acontece ao longo da vida. Este significado está dependente das nossas crenças – construção mental que temos e que nos dá uma certa perceção do mundo – e dos nossos pensamentos.
Por exemplo, uma estratégia para lidar com o stress é encontrar outra atividade para aliviar esse sentimento. Neste caso, cada pessoa vai pensar numa atividade diferente que varia consoante as suas circunstâncias – para umas é comer, para outras será ver um filme, caminhar ou até ligar a um amigo.
Para além de trabalharmos o comportamento alimentar é fundamental a Reeducação Alimentar.
Cada vez existem mais mitos espalhados pela internet, fruto da cultura das dietas. Numa alimentação saudável é realmente possível “comer de tudo, mas não tudo”. Aliás, garantir a felicidade alimentar é imprescindível para uma relação saudável com a alimentação.
As regras rígidas das dietas restritivas fomentam o sentimento de culpa e a criação de pensamento disfuncionais sobre a comida, consequentemente levando ao aumento da ingestão alimentar e a uma má relação com a alimentação.
A sabedoria popular tem razão: o fruto proibido é realmente o mais apetecido. Se pensares que não podes comer certo alimento, estás a aumentar o teu foco nesse alimento supostamente proibido. É contraproducente – não vamos deixar de pensar nele até o comermos. E quando cedemos ao “desejo”, entramos num processo de despedida do alimento, como se fosse a última vez que o fossemos comer, o que faz com que comamos mais do que a nossa vontade ou necessidade. Pensamentos como “deixa-me aproveitar ao máximo, que amanhã não posso” ou “é a última vez” levam a extremismos alimentares.
Como é possível comer de tudo sem prejudicar a nossa saúde?
É possível manter uma alimentação saudável e equilibrada sem proibidos através do princípio 80/20. Isto significa comer até 20% do valor energético total diário com alimentos pobres nutricionalmente (ricos em “má” gordura e açúcar) e no mínimo 80% de alimentos ricos nutricionalmente (ricos em micronutrientes, como minerais e vitaminas, ricos em fibra e proteína, pobres em açúcar e “má” gordura). Desta forma garantimos a nutrição do nosso corpo, mas também da nossa alma sem qualquer tipo de restrições.
É verdade que o stress influencia a nossa alimentação, mas sabias que a nossa alimentação também influencia o nosso stress?
A saúde do nosso intestino, que funciona quase como um segundo cérebro, e a qualidade do nosso sono estão relacionadas com a nossa saúde mental. Por isso, cuidar dos intestinos e do sono é também cuidar da nossa mente.
Algumas estratégias que podes adotar nesse sentido são: manter uma excelente hidratação, uma boa variedade alimentar e ainda uma ótima qualidade alimentar. É difícil manter uma mente sã se tiveres défices de nutrientes que fazem o cérebro funcionar, como minerais, vitaminas, fibras e ómega-3, e/ou se consumires em excesso alimentos pobres nutricionalmente que perturbam o bom funcionamento do cérebro, como gordura saturada e trans, açúcar, álcool, corantes e conservantes.
Quando falamos em qualidade alimentar, é importante priorizar a ingestão de alimentos ricos em triptofano, magnésio e vitamina do complexo B diariamente, pois estes nutrientes contribuem para a produção de serotonina, a hormona da felicidade, essencial para combater o stress. E facilmente encontramos estes nutrientes em alimentos comuns do dia-a-dia, como, por exemplo: ovos, leite e derivados, arroz, banana, alguns vegetais, carne e peixe. Deves também priorizar alimentos ricos em melatonina e em ómega-3, que ajudam a regular o nosso sono, presentes em alimentos como aveia, sementes, oleaginosas, leguminosas, alguns vegetais e frutas.
Para além disso, devemos ter especial atenção à quantidade de cafeína, que quando ingerida em excesso pode contribuir para o aumento do stress, bem como o horário em que é consumida – devemos ingerir nos primeiros terços do dia, ou seja, 8h a 9h antes de deitar.
Outra estratégia muito interessante para melhorar a relação com a alimentação é o Mindful Eating.
Como o próprio nome indica, é a prática de atenção plena no ato de comer. Trata-se de prestar atenção de forma intencional, no momento presente, sem julgamento. É um treino da direção da atenção para a comida, para os sinais internos do corpo, especialmente de fome, de saciedade e de satisfação.
A forma que comemos é a forma que vivemos, quando mudamos a forma de comer, mudamos a forma de viver.”
Jan Chozen Bays
Não há dúvida de que as nossas emoções, não só o stress, têm impacto nas nossas escolhas alimentares e vice-versa. Contudo, existem muitas ferramentas para construir uma boa relação com a alimentação e gerir melhor as emoções.