Neste artigo, exploraremos 7 questões relacionadas com oftalmologia. Desde os riscos do uso de lentes de contacto até as possíveis complicações do glaucoma e a importância de estabelecer limites para o uso de tecnologias digitais pelas crianças, abordaremos aspectos cruciais para preservar a visão. Aprenda sobre uveíte, conjuntivite e os sinais de alerta para problemas oculares que requerem atenção imediata. Descubra também as implicações do queratocone e o potencial da cirurgia para tratar a miopia severa. Os seus olhos merecem cuidados especiais, e estamos aqui para orientá-lo nessa jornada pela saúde visual.
1. Tenho grande miopia (18 dioptrias). Recomenda a cirurgia?
Sim, desde que sejam cumpridos os critérios básicos de segurança (inclusão/exclusão), idade, estabilidade refrativa, profundidade da câmara anterior, exclusão de doenças gerais ou locais impeditivas (por exemplo, glaucoma ou retinopatia diabética) e boas condições da retina. É essencial realizar uma avaliação da retina, incluindo a coroidose miópica degenerativa, antes de prosseguir com o procedimento cirúrgico. No caso de miopia muito alta ou córnea muito fina, a cirurgia a laser, LASIK, não é indicada devido aos riscos futuros de desenvolver um queratocone iatrogénico. Nestes casos, a opção é a cirurgia de implante de lentes intraoculares fáquicas, usada especialmente para a correção de altas miopias.
As lentes intraoculares fáquicas são seguras, duradouras e reversíveis (a lente permanece enquanto desejado, mas pode ser removida a qualquer momento) com poucas e controláveis complicações. Se o paciente tiver mais de 40 anos e desejar operar a miopia, deve ser informado de que a sua visão de perto vai piorar, assim como em qualquer pessoa que vê bem, devido ao aparecimento da presbiopia, onde esticamos o braço para ler. O paciente irá perder a vantagem que os míopes têm na visão de perto e inevitavelmente precisará usar óculos para leitura. Esse não é um problema da cirurgia, mas uma questão relacionada com a evolução normal da idade da pessoa.
O princípio básico para o sucesso da cirurgia de correção dos erros refrativos (miopia, hipermetropia e astigmatismo) é uma avaliação pré-operatória correta e o respeito aos parâmetros de segurança de cada procedimento. Contudo, é importante fazer um aviso, a grande questão nos altos míopes é a coroidose miópica degenerativa, o que deve ser monitorizado cuidadosamente devido ao risco de progressão para a perda de acuidade visual. Apesar de a cirurgia permitir que o paciente deixe de usar óculos ou lentes de contato, não tem qualquer efeito na evolução da doença.
2. O que é o Queratocone e qual o melhor tratamento?
O Queratocone é uma doença não-inflamatória e distrófica da córnea que se manifesta em pessoas jovens e pode progredir, normalmente, até aos 40 anos. Afeta cerca de uma pessoa em cada mil e, geralmente, é bilateral, embora assimétrico na maioria dos casos. É considerada uma doença hereditária e quando existe histórico familiar de queratocone é importante procurar um oftalmologista para uma detecção precoce da doença e acompanhamento ou vigilância.
Esta doença consiste na deformação progressiva da córnea, tornando-a mais fina e alterando a sua curvatura, e resulta na diminuição da acuidade visual. Inicialmente, a visão pode ser corrigida com óculos, mas a evolução da doença pode levar a quadros sem possibilidade de correção.
Os primeiros sintomas associados ao queratocone incluem o aparecimento de miopia e astigmatismo, imagens-fantasma, halos em torno das luzes, instabilidade refrativa e dores de cabeça frequentes causadas pelo esforço ocular. Dado que esses sintomas também podem estar presentes noutros problemas oftalmológicos, a avaliação por um médico oftalmologista é fundamental.
O diagnóstico precoce é a melhor maneira de iniciar um tratamento eficaz para deter a progressão da doença. Uma avaliação clínica e exames complementares de diagnóstico, incluindo a topografia corneana, são necessários para uma avaliação adequada.
Atualmente, uma das técnicas mais utilizadas e com melhores resultados para interromper a progressão do queratocone é o Crosslinking da Córnea, uma técnica que aumenta a resistência biomecânica da córnea, impedindo assim o avanço da doença. O tratamento é realizado através da aplicação de riboflavina, combinada com a irradiação da córnea com luz UV-A para aumentar a rigidez da córnea e impedir sua deformação contínua.
O Crosslinking da Córnea apresenta melhores resultados quando aplicado em casos em que a deformação corneana ainda permite uma boa visão com correção através de óculos, tornando crucial um diagnóstico precoce e adequado.
Em fases mais avançadas da doença, o tratamento pode envolver cirurgia. Nos casos em que a córnea mantém sua transparência, a cirurgia pode consistir na introdução de anéis intracorneanos. Se a transparência estiver comprometida e o queratocone estiver numa fase mais avançada, pode ser necessária uma cirurgia de transplante de córnea. Os transplantes de córnea podem ser penetrantes, substituindo completamente a córnea, ou lamelares anteriores profundos, preservando sua camada mais interna.
3. As crianças e as novas tecnologias: Devemos estabelecer regras ou evitar aborrecimentos?
Num mundo cada vez mais dominado pela tecnologia, é fácil encontrar crianças que mal sabem dar o laço nos atacadores dos sapatos, mas já estão a navegar na Internet e a usar smartphones ou tablets. No entanto, surge a questão sobre se essa inserção tão precoce no mundo da tecnologia é benéfica para a criança ou se é apenas uma forma dos adultos a manterem sossegada, prescindindo de atividades turbulentas, mas enriquecedoras para o seu desenvolvimento.
Um estudo realizado pela AVG Technologies em 2014, com famílias de todo o mundo, demonstrou que 66% das crianças entre 3 e 5 anos de idade conseguiam usar jogos de computador, 47% sabiam como usar um smartphone, mas apenas 14% eram capazes de dar o laço nos atacadores dos sapatos sozinhas.
A terapeuta Cris Rowan, por exemplo, defende que o uso de tecnologia por menores de 12 anos é prejudicial ao desenvolvimento e aprendizagem da criança. Segundo ela, a superexposição da criança a telemóveis, Internet, tablets ou televisão está relacionada ao déficit de atenção, atrasos cognitivos, dificuldades de aprendizagem, impulsividade e problemas em lidar com sentimentos como a raiva. Outros problemas comuns seriam a obesidade (devido à menor atividade física), privação de sono (se usam as tecnologias dentro do quarto) e o risco de dependência das tecnologias, além das consequências sobre o sistema ocular.
De forma resumida, o uso prolongado das novas tecnologias pode afetar o sistema ocular de duas maneiras, enquadrando-se no Síndrome Visual dos monitores das novas tecnologias:
Primeiro, ao olhar para um ecrã ou um livro, o reflexo de pestanejo diminui, o que provoca uma maior evaporação da lágrima. Outra alteração dos utilizadores crónicos e prolongados (acima de 4h/dia) de ecrãs é o degradar do funcionamento das glândulas de Meibomius, que existem nas pálpebras e são responsáveis pela produção do componente lipídico da lágrima. Este componente melhora a lubrificação do olho e estabiliza a lágrima, reduzindo a sua evaporação. Estas duas alterações provocam sintomas de olho seco, como sensação de corpo estranho, ardor, olhos vermelhos, sensação de peso nas pálpebras, necessidade de pestanejar ou fechar os olhos.
Segundo, o olhar por longos períodos para um objeto próximo provoca no olho a necessidade de fazer um esforço acrescido para focar esse mesmo objeto, a acomodação. A acomodação por períodos longos leva a cansaço ocular, causando sintomas como visão turva temporária, dores de cabeça, dificuldade de focagem ou sensação de peso nos olhos.
4. O Glaucoma pode levar à cegueira?
O glaucoma é uma das três principais causas de cegueira irreversível em todo o mundo. Estima-se que existam cerca de 90 milhões de pessoas com glaucoma, e em Portugal, há cerca de 140 mil casos, dos quais aproximadamente 7 a 10 mil resultam em cegueira.
Os custos diretos e indiretos associados ao glaucoma são significativos. Por exemplo, no Reino Unido, em 2004, os gastos chegaram a cerca de 130 milhões de libras por ano, custeados pelo contribuinte. Em países desenvolvidos, como referência naquele mesmo ano, foram gastos cerca de 5 milhões de euros por cada 100 milhões de habitantes. É importante ter consciência dos custos associados ao Sistema Nacional de Saúde (SNS), afetando a todos nós, bem como os custos para o próprio doente, especialmente quando muitos enfrentam dificuldades para adquirir a medicação necessária. Além disso, existem fatores de extrema importância e não quantificáveis, como a perturbação da qualidade de vida do doente e da família.
Embora não haja cura definitiva para o glaucoma, os tratamentos existentes, como medicação, laser e cirurgia, conseguem atrasar a progressão da doença e minimizar os efeitos na qualidade de vida do paciente, reduzindo assim os custos para o doente e a sociedade.
A detecção precoce é fundamental, dada a irreversibilidade das lesões causadas pelo glaucoma. Embora a terapêutica médica com colírios seja preferível por não ser invasiva, a eficácia dos fármacos existentes e a adesão do doente ao tratamento muitas vezes são insuficientes, o que leva à progressão contínua da doença. Em casos mais avançados, pode ser necessário recorrer a atitudes terapêuticas mais agressivas, como a cirurgia, que tem maiores custos e complicações.
Em 2016, surgiu um novo tipo de laser com tecnologia micropulsada, aplicada sem a necessidade de invasão do olho, apresentando resultados promissores. Esse novo Iridex Cyclo G6 Glaucoma System representa uma poderosa e única arma na luta para travar a progressão do glaucoma, especialmente em doentes difíceis.
5. Olhos vermelhos e visão turva: conjuntivite ou risco de perder a visão?
Quando surge o olho vermelho com visão turva, pode haver risco de perder a visão, e nem sempre é apenas uma conjuntivite. Esta combinação de sintomas é comum e pode ser provocada por diversos fatores ou problemas associados à vida quotidiana. No entanto, não devemos atribuir de imediato a causa a uma simples conjuntivite.
Podemos dividir as possíveis causas em dois grupos, com diferentes níveis de gravidade, mas todas devem ser levadas a sério, e uma delas é uma referência única de patologia grave:
1. Hábitos de vida:
- Consumo de álcool associado ou agravado pela privação de sono;
- Reações alérgicas a elementos ambientais externos, como polens ou poluição, ou de origem interna, como poeiras, mofo/humidade, pêlos de animais ou ácaros. Neste caso, pode ser uma conjuntivite alérgica, que não é contagiosa, mas causa desconforto, prurido, ardor, inchaço das pálpebras, fotofobia, sensação de corpo estranho e lacrimejo. Essas situações geralmente retornam à normalidade após a resolução das causas.
2. Traumatismos, infeções e perturbações imunitárias:
- Traumas oculares, queimaduras químicas, infeções como toxoplasmose, tuberculose, ou perturbações imunitárias como lúpus ou artrite reumatóide, podem causar uveíte, que também se manifesta com olho vermelho e visão turva. Esses sintomas podem ser acompanhados de dor ocular, cefaleias ou alterações no campo visual. Nesses casos, o grau de gravidade implicará o risco de sequelas com perda de visão.
3. Alteração da pressão intraocular (glaucoma):
- Quando há um desequilíbrio entre a produção e eliminação do humor aquoso no olho ocorre hipertensão ocular ou glaucoma. Os doentes com glaucoma apresentam perda gradual de visão, especialmente do campo visual periférico, além de vómitos, náuseas, dores oculares, fotofobia, além do olho vermelho e visão turva. Nesse caso, há um risco real de perda definitiva do campo visual e, em última instância, da acuidade visual.
Como podemos perceber, esse binómio aparentemente inofensivo pode ter implicações finais muito diferentes e, por isso, o olho vermelho com visão turva pode ter múltiplas e diversas causas com potencial de gravidade variável. Logo, é essencial procurar um/A oftalmologista para um diagnóstico correto e tratamento adequado. A solução geralmente passa pelo controlo preventivo ou eliminação da causa, e é recomendável a criação de uma rotina de consulta periódica com o oftalmologista.
6. O que é uma uveíte?
A uveíte é uma inflamação intraocular que afeta o trato uveal, uma camada vascular média do olho, composta por três partes: íris (porção anterior), corpo ciliar (porção intermediária) e coróide (porção posterior). Existem dois tipos de uveíte, classificados de acordo com a duração dos sintomas: aguda e crónica. A uveíte aguda tem um início rápido e dura entre duas a seis semanas, enquanto a crónica tem um início mais lento e pode durar mais de seis semanas, podendo até manter-se por muitos meses. É importante referir que a uveíte pode levar a uma cegueira irreversível se não for tratada a tempo.
Os sintomas mais comuns de uveíte incluem dor ocular e peri-ocular, fotofobia, edema palpebral e vermelhidão ao redor da córnea. É caracterizada pela ausência de secreção ocular, pupila miótica, reflexo ao estímulo luminoso reduzido e visão turva.
As uveítes podem ter diversas causas, como artrite reumatóide juvenil, toxoplasmose, herpes, citomegalovírus, bactérias, entre outras. Algumas uveítes estão associadas a doenças específicas, como a doença de Behçet e a Síndrome de Vogt-Koyanagi-Harada, mas boa parte dos casos tem causa desconhecida.
Se não for tratada adequadamente e a tempo, a uveíte pode causar danos irreversíveis ao olho, como glaucoma, descolamento de retina ou cicatrizes na retina, o que pode levar à redução permanente da visão.
O paciente com uveíte requer uma atenção especial e deve ser tratado como portador de uma doença complexa, sendo abordado por uma equipa médica multidisciplinar.
Quando a causa da uveíte não é identificada, o tratamento adotado é não-específico e inclui o uso de corticosteroides e anti-inflamatórios não-hormonais, além de midriáticos e drogas imunodepressoras para controlar a inflamação e evitar complicações graves.
7. Qual o risco de usar lentes de contacto?
O uso de lentes de contacto pode apresentar riscos para a saúde ocular, e muitas pessoas que as utilizam desconhecem ou ignoram os cuidados necessários, aumentando o perigo para os seus olhos. Existem procedimentos essenciais que devem ser seguidos para garantir uma boa utilização das lentes de contacto:
- Não lavar as lentes com água corrente, pois esta é tratada e pode conter microrganismos que são prejudiciais aos olhos;
- Não humedecer as lentes com saliva, pois pode introduzir bactérias e outros agentes prejudiciais. Em situações de emergência, é preferível utilizar soro fisiológico ou lágrimas artificiais para lubrificar e limpar os olhos e as lentes de contacto;
- Prestar atenção ao reaproveitamento da solução de limpeza e trocar periodicamente as caixas de armazenamento das lentes, pois estas podem ficar contaminadas;
- Não usar lentes de contacto prescritas há muito tempo ou usá-las durante períodos muito prolongados, especialmente durante o sono. O descanso é essencial para a córnea receber nutrientes, lubrificação e oxigenação adequados, e dormir com as lentes pode levar a lesões oculares;
- Ter cuidado especial ao colocar as lentes de contacto antes da maquilhagem, para evitar o contato com produtos cosméticos que podem irritar os olhos;
- Não ignorar sinais de desconforto, como olho vermelho, visão turva ou qualquer outro sintoma ocular. Estes sinais devem ser investigados por um/a oftalmologista, pois podem indicar problemas mais sérios;
- Limitar o uso diário das lentes de contacto a 8 ou 9 horas para evitar fadiga ocular e desconforto.