Porque escrevi “A Terceira Índia”

Íris Bravo // Agosto 23, 2021
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A Terceira Índia
A Terceira Índia

Ser médica e trabalhar em Infertilidade é muito bom. Acompanhar os casais e fazer a ecografia em que encontro o tão desejado embrião, uma nova vida com um pequeno ponto a piscar no seu interior que significa tanto, faz-me feliz. Emociono-me sempre com aquele extraordinário momento, em que apreciamos em conjunto toda a beleza das formas de feijão do pequeno ser com dez milímetros que vemos no ecrã.

Trabalhar em Infertilidade também é mau. Porque apesar de conseguirmos ajudar muitos casais, não conseguimos ajudar todos, nem é previsível que o possamos fazer num futuro próximo, e isso é muito frustrante.

É difícil estar à frente de uma mulher que acompanhámos ao longo de vários tratamentos falhados e dizer-lhe que não a podemos ajudar mais. Após termos partilhado as suas angústias e anseios, custa não ter mais nada para lhe oferecer, sabendo que continua a sonhar com um bebé no colo exatamente como no dia da primeira consulta.

“A Terceira Índia” é uma homenagem a todas estas mulheres.

É injusto que outras tenham engravidado e ela não, apesar de ter feito as mesmas injeções, cirurgias e outros procedimentos que lhe propusemos, que ela aceitou cheia de esperança e confiança em nós. Foi a pensar que gostaria de fazer algo que chamasse à atenção para o sofrimento destas mulheres que comecei a escrever o livro: “A Terceira Índia”.

Idealizei a Sofia como uma heroína que as representasse e fiz do insucesso da Medicina o ponto de partida da história de “A Terceira Índia”, numa homenagem a todas as mulheres a quem dei alta, pela sua coragem numa batalha em que não alcançaram o tão desejado prémio, depois de uma luta que é dura e sobre a qual a maioria das pessoas que não passaram por ela pouco sabem.

A história de Sofia

Foi por isso que escolhi as palavras “a verdade é que me doía” para iniciar a jornada da Sofia, cujo maior desejo é ter uma família e está disposta a tudo para engravidar, algo natural, simples de alcançar e desprovido de sofrimento para a maioria das mulheres, mas não para ela, à semelhança das minhas doentes.

Depois, com o desenrolar da história que ganhou asas e talvez para redimir a “minha” Medicina que não tem resposta para tudo, imaginei que todos aqueles revezes eram necessários, porque ela estava destinada a ir para outros lugares e realizar ações que não aconteceriam se tivesse conseguido a tão desejada gravidez.

Rendi-me ao sincrodestino, essa ideia romântica de que os destinos dos seres humanos estão todos interligados e a acontecer ao mesmo tempo. Se analisarmos uma personagem num determinado momento, pode parecer-nos que está tudo a correr mal, mas porque vemos apenas um pequeno pedaço de um plano maior, só compreensível mais tarde e quando todos os intervenientes se tiverem cruzado.

No fundo, de uma forma um pouco egoísta porque apreciei bastante “a viagem” e “o romance”, acabei por escrever sobre outras causas que também me são queridas e por perdoar as limitações da Medicina, que levaram a Sofia para outro país e fizeram com que o mundo se tornasse um lugar um pouco melhor.

E como ela diz e eu também acredito, “é nas pequenas coisas que se muda o mundo“.

A Terceira Índia

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