Uma casa cheia de coisas que não usamos (algumas nem sequer gostamos…), mas que não conseguimos deixar ir. Soa-lhe familiar? Fique a saber que não está sozinha… Afinal, porque é tão difícil praticar o desapego?
A dificuldade no desapego é o principal motivo que impede muitas pessoas de conseguirem libertar-se do que já não faz sentido manter, e poderem assim viver em casas mais leves, mais fáceis de manter organizadas e de limpar.
Ter apego a alguns objetos que nos recordam momentos importantes e felizes do passado é perfeitamente compreensível e até saudável. Agora, quando o apego excessivo passa a condicionar a nossa vivência no presente, quando temos mais coisas em casa associadas ao nosso passado do que ao nosso presente, a quem somos hoje, então, aí sim, passamos a ter um problema e está na hora de aprender a deixar ir.
3 razões pelas quais é tão difícil praticar o desapego:
São três as principais razões pelas quais nos é, por vezes, tão difícil desapegar:
1. Apego desfocado ao passado
Chamo-lhe apego desfocado porque confundimos as memórias e vivências felizes do passado com objetos físicos que nos recordam as mesmas.
Ter um objeto especial que nos recorda um momento feliz da nossa vida na nossa casa, que nos faz sorrir e nos inspira alegria cada vez que olhamos para ele, é uma coisa. Outra é quando dizemos que não conseguimos desfazer-nos de inúmeras coisas que entopem a nossa casa e as quais, muitas vezes, nem sequer estão a ser honradas, mas, sim, enfiadas no fundo de um armário ou gaveta, num sótão ou numa arrecadação.
Para mim foi libertador quando entendi que podia perfeitamente ser fiel e honrar momentos importantes e felizes do meu passado, sem ter de carregar com inúmeras recordações físicas dos mesmos. Essas vivências e memórias são parte integrante de nós. Estão guardadas da forma mais especial de todas: na nossa mente e no nosso coração.
Gosto de fazer esta comparação: as memórias são as nossas raízes, que nos alimentam, que nos dão um sentimento de origem e de pertença, mas os objetos físicos excessivos que associamos às mesmas, podem ser uma âncora, condicionando-nos e impedindo-nos de viver em pleno o nosso presente, não abrindo espaço para as coisas que nos representam hoje.
2. Receio do futuro
É o famoso “pode ainda dar jeito”…
Principalmente para quem foi educado a guardar quase tudo para alguma eventualidade (como muitas de nós fomos), é muito difícil por vezes deixar ir, devido ao receio de que nos possa vir a fazer falta no futuro. E vamos assim entupindo a casa de coisas que não usamos, mas que achamos sempre que ainda podemos vir a usar…
Saber fazer uma reflexão consciente e honesta sobre a real probabilidade de essa “eventualidade” vir de facto a ocorrer e agir depois, de acordo com a resposta a que chegamos, é a única forma de conseguirmos ultrapassar esse bloqueio.
Na quase totalidade dos casos, são coisas que acabam por nunca vir de facto a fazer falta ou, se fizerem, arranjamos facilmente uma alternativa. E que, quase nunca, justificam o espaço físico e mental que ocupam nas nossas casas, às vezes anos a fio!
3. O sentimento de culpa
A culpa tolda-nos o julgamento em diferentes situações.
Por exemplo, a culpa em deixar ir porque nos foi oferecido:
Quantas vezes mantemos em casa coisas que nos ofereceram, que não usamos (e às vezes nem sequer gostamos), devido a este sentimento de culpa?
Também eu sentia muitas vezes isso, em especial se tinha sido alguém mais próximo a oferecer. Até que percebi que o verdadeiro propósito de um presente é cumprido no momento da troca: alguém nos oferece algo para demonstrar o seu afeto, ou para ter uma atenção connosco, e nós manifestamos a nossa gratidão em relação a esse gesto. Se, depois desse momento da troca, aquele objeto físico não nos reflete, se não tem nada a ver connosco (acontece muitas vezes que quem oferece escolhe de acordo com os seus próprios gostos e não dos da pessoa a quem vai oferecer), devemos sentir-nos livres para deixar ir esse objeto. Afinal, mantê-lo por culpa, sem o usar, não é a melhor forma de honrar algo que nos foi oferecido. Podemos, e devemos, dar-lhe uma nova oportunidade, doando-o, e permitindo que outras pessoas que o possam apreciar tenham acesso ao mesmo.
Outro exemplo, a culpa em deixar ir porque foi caro:
Eu costumo dizer que nunca devemos comprar nada só porque é barato, nem manter nada só porque foi caro.
O valor que foi investido naquele objeto já foi gasto. O facto de o mantermos, sem usar, na nossa casa, por culpa, não vai trazer-nos esse valor de volta. O melhor a fazer nestes casos é aceitar a aprendizagem que tivemos, doar a quem possa apreciá-lo mais do que nós, ou até vender e, aí sim, recuperar parte do montante que gastámos.
Manter apenas o essencial.
Aprender a praticar o desapego do que já não faz sentido manter na nossa casa e na nossa vida é a única forma de podermos viver em casas mais leves e organizadas, onde decidimos manter apenas aquilo que nos é essencial, que usamos, ou que mantemos só porque nos faz feliz só de olhar para eles.
Uma casa em que honramos o passado, mas em que abrimos espaço (físico, mental e emocional) para o presente, para a pessoa que somos e queremos ser.