O que faz um enfermeiro na escola?

Ângela Baptista // Março 30, 2019
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Saúde: Pode aprender-se na escola?

Hoje o tema da “nossa conversa” prende-se com algo que com certeza vos é muito familiar – A escola e a saúde.

Mais do que falar-vos da experiência em ser enfermeira neste espaço, quero partilhar convosco o quanto é imensa e adorável a capacidade das nossas crianças em aprender… (isto já não seria grande novidade!) mas em aprender comportamentos específicos, comportamentos de saúde.

A presença de uma enfermeira especialista em saúde infantil e pediátrica numa escola não é uma realidade comum e, por isso, muitas vezes desconhecida da maior parte dos pais.

Por isso mesmo, quero transmitir-vos o que de importante se pode fazer com as crianças ao nível de educação para a saúde na escola.

Conhecem esta realidade? Alguma vez pensaram sobre o tema? Consideram uma mais-valia?

Atendendo à complexidade crescente que carateriza os contextos da sociedade actual, a educação de uma criança é cada vez mais assoberbada de questões e inseguranças muito inerentes aos próprios riscos acrescidos que atualmente se colocam.

Um exemplo claro é a exposição fácil que as crianças têm através das redes socias, com o acesso fácil às novas tecnologias, tendo mesmo surgido numa “nova” forma de adição: “adições comportamentais e sem substância”.

Torna-se cada vez mais necessário garantir o acompanhamento da criança no seu quotidiano, lado a lado, tornando cada oportunidade, uma hipótese de evolução e crescimento.

Porquê um Enfermeiro Especialista em Saúde Infantil na escola?

O Enfermeiro Especialista em Saúde Infantil e Pediátrica detém conhecimentos aprofundados acerca das respostas da criança aos diferentes processos de vida e problemas de saúde.

A sua capacidade de compreensão global da criança permite-lhe instituir intervenções especializadas quer em resposta à doença, quer na prevenção da mesma.

A importância da primeira infância

Se nos concentrarmos no processo de desenvolvimento do ser humano, é na infância que se inicia a formação dos comportamentos e dos hábitos, sendo importante a transmissão dos mesmos, o mais precocemente possível. O cérebro da criança, principalmente até aos três anos, carateriza-se por uma grande plasticidade, logo também uma forte capacidade de aquisição de conhecimentos.

As crianças “querem fazer coisas” e habitualmente fazem aquilo que veem fazer. O comportamento por imitação é uma forte característica do desenvolvimento infantil. Há que fazer bom uso desta característica e aproveitar os momentos e locais chave para tal acontecer, como é o caso da escola.

Porquê a escola?

Para a grande maioria das crianças, a escola é o local onde ocupam a maior parte do seu tempo. É nela que decorrem as ações educativas complementares às da família. A escola torna-se a via ideal à concretização dos princípios da promoção da saúde.

A OMS diz-nos, através da Declaração de Liverpool (2005, p.2), que “a escola deve ser usada como uma das plataformas para a promoção da saúde, da qualidade de vida e da prevenção da doença em crianças e adolescentes, envolvendo famílias e comunidades”.

As aprendizagens sobre saúde oferecidas na escola, possibilitam não só o acumular de saberes, mas de competências – “saber fazer e saber ser” – saber realizar opções saudáveis e recusar comportamentos indesejados.

Temos disponíveis muitas directivas que suportam a presença do enfermeiro na escola. Em Portugal, o Plano Nacional de Saúde Escolar, internacionalmente o National Association of School Nurses (2016), defende a presença do enfermeiro nas escolas, alegando que permite a identificação estratégica de necessidades reais de toda a comunidade escolar e, consequentemente, uma atuação prioritária e personalizada.

Existe inclusivamente a designação de Escola Promotora de Saúde, uma escola que fortalece sistematicamente a sua capacidade de criar um ambiente saudável para a aprendizagem, sendo um espaço em que todos os membros da comunidade escolar trabalham, em conjunto, para proporcionar aos alunos, professores e funcionários, experiências e estruturas integradas e positivas que promovam e protejam a saúde (DGE, 2014).

Quais as atividades efetivamente realizadas por um Enfermeiro Especialista em Saúde Infantil na escola?

As atividades que desenvolvo vão desde o berçário até ao ensino primário. Todas as actividades são adaptadas à faixa etária e compreensão das crianças, com recurso a filmes, jogos, role play, slides projetivos, entre outros.

Além da intervenção direta nos problemas reais de saúde e todo o acompanhamento e avaliação do desenvolvimento das crianças, o foco é educar para a saúde: preparar as crianças e toda a comunidade escolar, incluindo a família, para cuidarem da sua saúde.

Mais do que vos descrever todas as atividades deixo-vos com uma fotorreportagem que fala por si:

  • Avaliação global do desenvolvimento infantil no sentido de referenciar alguma limitação, ou necessidade de estímulo da mesma;

  • Cuidados de Higiene: Ensino de lavagem das mãos com técnica correta desde os três anos, com treino prático pela criança. Aprender desde logo que a lavagem das mãos é o melhor meio de prevenção de doenças;

  • Saúde Oral: Higienização oral, desde os três anos, com ensino às crianças da técnica correta, bem como cuidados para evitar transmissão de doenças;

  • Hábitos de Higiene: Ensino dos bons hábitos de limpeza após urinar/evacuar e quais as diferenças no menino e na menina;
  • Comportamentos preventivos de transmissão de doenças: Como se espirra e tosse? Como me protejo das bactérias?
  • Alimentação saudável: Os alimentos “bons” e os “menos bons”; A Roda dos Alimentos;
  • Desenvolvimento da saúde mental e competências socioemocionais: Atividades de Mindfulness;

  • Educação para os afetos e a sexualidade: Sessões de educação para a sexualidade às crianças – “De onde vêm os bebés?”; principais diferenças entre sexo e género; ensino sobre proteção do corpo, de acordo com o estadio etário, preparando desde logo para a proteção contra o abuso sexual;

  • Prevenção dos acidentes e primeiros socorros: Capacitar as crianças, a partir dos 4 anos, para a prestação de primeiros socorros e SBV (suporte básico de vida, profissionais e crianças);

  • Hospital das Brincadeiras: Periodicamente, as crianças realizam esta actividade objetivando uma familiarização com os instrumentos e procedimentos a que são muitas vezes submetidas aquando situação de doença. Estamos assim a prevenir um estado de ansiedade e a reduzir o medo.

Com este artigo queria alertar-vos para esta realidade e gerar curiosidade e sensibilidade para este tema. Qual a vossa opinião? Porque não desafiarem a escola das vossas crianças? Terei muito gosto!

Deixo ainda os parabéns ao Director da escola onde dedico grande parte do tempo a ensinar saúde, Dinis Bernardes, que seja um exemplo para os demais, por acreditar na importância desta presença, e a todos os profissionais, pais e crianças que colaboram nesta missão.

Breve Nota Bibliográfica:

  • DGS (2006). Programa Nacional de Saúde Escolar (Circular Normativa nº7/DSE/2006). Lisboa: Direcção Geral da Saúde.
  • Rede Europeia e Portuguesa de Escolas Promotoras de Saúde, Editorial do ME, Fev.1999, 2ª edição.
  • Rowling, L. & Jeffreys, V. (2000) Challenges in the Development and Monitoring oh Health Promoting Schools. Health Education Journal, volume 100, n. º 3, 117-123.
  • WHO (1997). The Jakarta Declaration on leading health promotion into 21st Century. Fourth International Conference of Health Promotion. Geneve: World Health Organization.
  • ALBUQUERQUE, M. (2006) Educação Pré-Escolar e Promoção da Saúde: Que necessidades de formação profissional Contínua. Tese de Mestrado. Dissertação com vista à obtenção do grau de Mestre em Saúde Escolar. Apresentada Faculdade de Medicina de Lisboa.

Nota: Fotografias da especialista.

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