O que esperar de 2022 em termos de sustentabilidade?

Eunice Maia // Janeiro 29, 2022
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Depois de um 2021 novamente marcado pela pandemia, pela crise climática e pelo (quase) fracasso da COP-26, o que esperar do novo ano no que toca à sustentabilidade?

Bem que o planeta precisa que entremos com o pé direito em 2022. Não estou a falar de sorte, mas, sim, de compromisso. Não estou a falar de rituais ou de superstições, mas de ação. Que seja um ano de ação a nível individual e coletivo.

O balanço de 2021

Houve, apesar de tudo, sementes de esperança que darão certamente frutos ao longo de 2022, como a aprovação pela Assembleia da República e promulgação da Lei de Bases do Clima  (Lei n.º 98/2021), que sublinha, no seu artigo 2.º, que vivemos uma situação de “emergência climática”, reconhecendo que “todos têm direito ao equilíbrio climático”, que “consiste no direito de defesa contra os impactes das alterações climáticas, bem como no poder de exigir de entidades públicas e privadas o cumprimento dos deveres e das obrigações a que se encontram vinculadas em matéria climática”. Este diploma visa “promover a segurança climática” e prevê a criação futura do Conselho para a Ação Climática.

Ainda de 2021, destacaria igualmente a proibição de embalagens e produtos descartáveis em plástico com a aprovação, em 2 de setembro, do decreto-lei que procedeu à transposição parcial da Diretiva (UE) 2019/904, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à redução do impacto de produtos de plástico de utilização única. Passou a ser proibida a colocação no mercado de determinados produtos de plástico de utilização única (como cotonetes, talheres, pratos, palhas, varas para balões, bem como copos e recipientes para alimentos feitos de poliestireno expandido). Esta interdição contribui não só para reduzir o consumo de produtos de origem fóssil, como para a redução da produção de resíduos, na sua maioria, não recicláveis e ainda para minimizar a poluição marinha. Por outro lado, marca igualmente a entrada em vigor do direito dos cidadãos a levarem os seus recipientes e embalagens para as superfícies comerciais (take away, talho, peixaria, padaria, mercearia, charcutaria…).

Não chega, até porque substituir o plástico por alternativas que têm, muitas vezes, maior pegada não é solução ou é tentar resolver um problema criando outro. Além disso, era também importante (e inteligente) combinar estas medidas com o Sistema de Depósito com Retorno para embalagens descartáveis (independentemente do material de que são feitas), que foi aprovado em 2018 pela Assembleia da República e que deveria entrar em funcionamento em janeiro de 2022. Caso nada seja feito para estruturar este sistema eficazmente, Portugal vai continuar a desperdiçar 4 milhões de embalagens por dia durante, pelo menos, mais um ano.

E se a COP-26 desiludiu por não ter havido assinatura de um documento que regulamente os Acordos de Paris, os consensos setoriais obtidos relativos às emissões de metano, à reflorestação e ao incentivo às energias limpas fizeram parte do saldo positivo.

Os desafios de 2022

Curiosamente, neste artigo de janeiro do ano passado, sobre motivos de esperança, há vários pontos que se mantêm perfeitamente atuais, alguns que se concretizaram e muitos que transitam para este ano novo. Vale a pena regressar lá e fazer “check” na lista de “ecorresoluções” que foram (ou não) cumpridas. Algumas estão, sem dúvida, a revelar-se mais compridas do que cumpridas. Cabe-nos também a nós, enquanto cidadãos, neste 2022, pressionar e votar nas soluções que aceleram e salvaguardam a justiça climática.

Já ninguém ignora (é um facto confirmado pelo último relatório do IPCC – Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas) que as alterações climáticas são antropogénicas (causadas ou originadas pela atividade humana) e constituem um dos maiores desafios ambientais com que a humanidade se confronta no século XXI e com que se confrontará nos seguintes, devido às implicações que têm sobre a energia, a disponibilidade de água e alimentos, o ambiente e os serviços dos ecossistemas, a saúde humana e a segurança das populações, dos países e da humanidade. 

Aqui ficam, por isso, algumas das áreas de atuação e dos desafios mais urgentes para 2022 e para esta década, com base no terceiro capítulo do ensaio “Alterações Climáticas”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, da autoria do professor Filipe Duarte Santos:

– Ouvir a ciência

A pandemia veio confirmar que a ciência salva e que a cooperação e partilha de conhecimento são essenciais para ultrapassar um problema global, seja ele um vírus ou a crise climática.

A investigação científica é (e continuará a ser) fundamental para a avaliação integrada das vulnerabilidades, impactos e medidas de adaptação baseada em cenários climáticos.

– Tecnologia e clima

Um futuro de adaptação e resiliência climática exige, no caso do setor especialmente sensível da agricultura, o desenvolvimento de sistemas de alerta precoce de eventos extremos (inundações; ciclones; ondas de calor), sistemas de proteção e gestão de secas e inundações; adaptação das culturas a um clima progressivamente mais quente e seco e à escassez de água; e restauração dos solos.

– Transição energética

“Após décadas em que o mundo se deixou adormecer no conforto dos combustíveis fósseis e ignorou o problema das alterações climáticas, há finalmente sinais de que caminharemos para a descarbonização e neutralidade carbónica através da transição energética para as energias renováveis.” (op. cit. p. 86)

O acesso a energia não-fóssil barata é um dos maiores desafios do século XXI.

Não chega aumentar a eficiência energética; é necessário praticar a suficiência energética: alterar os comportamentos de forma a diminuir o consumo de energia per capita é uma questão de equidade.

– Igualdade de género

As mulheres são em geral mais vulneráveis aos impactos negativos das alterações climáticas. Esta vulnerabilidade resulta das desigualdades de género criadas por limitações de acesso à educação e por normas sociais, estruturas socioeconómicas, rendimentos e tipos de ocupação profissional diferenciados.

A diminuição da desigualdade de género contribui para aumentar a resiliência das populações às alterações climáticas.” (op. cit. p. 84)

– Cidades resilientes

As cidades deverão contribuir de forma determinante para a solução do problema das alterações climáticas, promovendo políticas de mitigação (regulamentos, instrumentos e políticas (op. cit. p. 95):

  • urbanismo e espaços verdes
  • eficiência energética dos edifícios
  • redes elétricas inteligentes
  • redes de prossumidores (consomem e produzem) de energia elétrica
  • transportes públicos
  • gestão de resíduos

Exemplos no terreno de quem já está a desenvolver a mitigação e adaptação às alterações climáticas nas zonas urbanas:

– Integridade da biosfera

“A humanidade debate-se com a crise da perda da biodiversidade. A integridade da biosfera tem vindo a ser gravemente afetada por algumas atividades humanas, havendo mais de um milhão de espécies de plantas e animais que estão em perigo de extinção. Estamos perante a sexta extinção de espécies, tendo as cinco anteriores causas naturais.” (op. cit. p. 97)

É, portanto, essencial:

  • usar de forma sustentável o oceano e os recursos marinhos (a este propósito, Lisboa receberá em 2022 a Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos, sob o tema da proteção e regeneração dos Oceanos);
  • restaurar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação e travar a perda de biodiversidade terrestre.

Assim, com uma Lei de Bases do Clima publicada que reconhece a situação de “emergência climática”, a neutralidade carbónica é uma prioridade para garantir a segurança climática às próximas gerações, assegurando que a temperatura global se mantém abaixo dos 1,5ºC.

Em 2022, queremos (e precisamos de lutar para) que as verbas massivas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) sirvam a implementação de medidas ambientais e climáticas e a promoção dos empregos verdes, para uma recuperação económica sustentável.

Por um ano novo mais consciente e mais justo. A pensar numa década decisiva de transformAÇÃO.

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