O desaparecimento do galo

Fátima Lopes // Agosto 16, 2021
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Março de 2020. Perante uma pandemia mundial, as famílias foram aconselhadas a permanecerem em casa, naquele que viria ser um primeiro confinamento. Filipe, um menino de 11 anos, ficava longe dos amigos da escola, dos professores e dos familiares com quem estava habituado a partilhar os seus dias. Tal como com todas as crianças, as suas rotinas foram alteradas. Isolado num monte no Alentejo, apenas com os avós e a irmã, dedicou-se a um projecto especial: criar as suas galinhas

Os cuidados com os animais já os tinha aprendido com o avô, mas Filipe achava-se agora capaz de se tornar cuidador. E tinha toda a razão. Com a ajuda dos ensinamentos dos avós, recuperou o local onde começou a criar galinhas e galos. A primeira geração de pintainhos não tardou a chegar e, por eles, aperfeiçoou a sua faceta de cuidador, desenvolveu o seu sentido de responsabilidade e também um grande carinho por estes animais. 

As novas rotinas de Filipe passaram a contagiar toda a família, para quem tudo era uma satisfação. Diariamente deslocavam-se à capoeira para recolher os ovos frescos e abrir as portas para que os animais passeassem livremente durante o dia. Era uma alegria vê-los a usufruírem de tudo o que a terra tem para lhes dar. Ao final da tarde, Filipe regressava para abrir a portinha da capoeira. Os animais, reconhecendo já o cuidador, encaminhavam-se para o galinheiro, onde pernoitavam. 

Os dias passaram, um após o outro, sem grandes percalços ou sustos. Até que um dia aconteceu, já nas férias de Verão de 2021, algo diferente do habitual… O pequeno galo branco, com penas longas e muito vistosas na cauda, desapareceu! 

Era meio-dia, o sol abrasador do Alentejo queimava, e rapidamente Filipe deu o alerta à família: “O galo desapareceu”. A família começou a procurar o animal, encontrando alguns sinais do pequeno galo. Uns montinhos de penas aqui, outros acolá. Não pareciam restar dúvidas que ali tinha acontecido um ataque de um bicho qualquer! 

A família começou, então, a recordar as histórias dos ataques de raposas tão presentes em livros e filmes de animação. A balbúrdia na quinta estava instalada! Dizem os entendidos que quando as raposas velhas atacam as galinhas, estas não têm hipótese de se safar. Porém, se for um ataque de uma raposa mais jovem, existe, sim, a possibilidade da vítima sobreviver. E, o galo podia ser de porte pequeno, mas era forte. Teria sobrevivido ao ataque? 

As horas passavam e a mãe de Filipe começava a perder a esperança de encontrar o pequeno e vistoso galo com vida. “Filho, a mãe promete que tenta arranjar outro”, disse tentando consolar o filho. Mas, Filipe, visivelmente triste e em lágrimas, nunca desistiu. Agarrou-se a todas as pistas e assim que se apercebeu que existiam penas espalhadas numa zona diferente da propriedade, não hesitou e correu. Correu. Desceu o monte, até que o encontrou! O pequeno galo, agora praticamente sem penas, encontrava-se junto de uma árvore. Estava muito ferido e debilitado, mas estava vivo. Filipe agarrou o pequeno galo e emocionado correu para junto da mãe, a quem disse: “Viste mãe, eu não desisti. Eu consegui encontrá-lo”

Ao final da tarde, a veterinária que reside perto, passou pela capoeira para ajudar Filipe a cuidar do galinho branco. “É um milagre este animal estar vivo”, disse, realçando o instinto de sobrevivência e a força que o galo teve para bicar a jovem raposa até que esta o soltasse. A verdade é que, apesar dos hematomas e de todas as feridas, com a colocação de um spray específico e de muito amor e carinho, foi possível ajudar o pequeno galo a ultrapassar este grande susto.

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Uma história com vários ensinamentos

Isto poderia ser a história do desaparecimento de um galo. Poderia ser a história de outro Filipe, de outra família. Mas, é apenas mais uma das histórias da nossa família. Das histórias que vivemos e com as quais aprendemos. 

A experiência com a criação de galinhas e galos tem sido muito interessante, bonita e enriquecedora, não só para o meu filho Filipe, mas para toda a família. Todos nos fomos afeiçoando a estes animais, que são criados com muito carinho pelo Filipe, atribuindo a tudo isto um significado ainda mais belo. 

As experiências das crianças no campo são muito importantes. 

Para muitos, as rotinas de cuidar de animais de campo podem ser apenas a realidade normal, mas para quem sempre viveu em cidades e em apartamentos é, sem dúvida, uma experiência especial. Principalmente quando falamos de crianças, que com estas experiências adquirem ensinamentos preciosos como a ligação com a natureza, a responsabilidade de cuidarem e de sentirem que têm responsabilidade na vida dos animais. 

Aquele foi um mundo que o Filipe criou e do qual cuida com muito amor. 

Esta situação do desaparecimento do galo, demonstrou-nos mais uma vez, toda a dedicação e amor que ele tem a estes animais. Não são cães, nem gatos, nem animais que estamos normalmente habituados a ter como animais de estimação, mas os laços e o amor que ele lhes tem, são os mesmos. E, por isso, tudo isto foi muito importante para ele. 

Ele não desistiu. 

E, o facto de não ter desistido foi importante para que aprendesse uma grande lição: não se desiste daquilo que queremos muito na vida, nem desistimos daqueles que amamos e cuidamos.

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