Minha irmã, uma referência

Fátima Lopes // Maio 31, 2020
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Eu que não sou muito apologista do Dia do Pai, Dia da Mãe ou o Dia dos Namorados porque acho que os dias somos nós que os fazemos e não as datas no calendário, acho curioso que exista um Dia dos Irmãos. E acho até que é bonito e faz algum sentido. 

Dia dos Irmãos

Esta não é uma data em que corremos o risco de dizer que só está estabelecida para que haja oferta de presentes, ou seja, uma data que esteja associada a questões materiais tal como muitas datas que são estabelecidas porque comercialmente interessa. Este não é de todo o caso porque não é suposto oferecer materialmente o que quer que seja a um irmão e/ou a uma irmã, mas, sim, é um dia em que pelo facto de estar estabelecido nos ajuda a lembrar que eles têm  tanta, mas tanta importância que são merecedores de uma data no calendário

Eu tenho uma relação muito, muito estreita com a minha irmã.

Chama-se Lúcia, a minha querida irmã. E, efectivamente, não é a grande distância física que nos impossibilita de manter um nível de intimidade elevado

Em miúdas éramos cão e gato, dávamo-nos pessimamente. Andávamos sempre às turras porque éramos muito diferentes – eu gostava muito de brincar com as bonecas e as coisas da casa, e ela não gostava nada disso. As brincadeiras da minha irmã não passavam pelos mesmos interesses que os meus. Mas, o certo é que quando chegou a uma fase da nossa vida em que nos tivemos de separar, eu percebi aquilo que me unia à minha irmã. Ela foi estudar para Vila Real de Trás-os-Montes e eu fiquei a viver no Barreiro com a minha mãe. No mesmo ano o meu pai emigrou, tornando tudo mais difícil.

Foi a partir do momento em que nós nos separámos, que eu percebi o amor imenso que tinha pela minha irmã, o quanto ela era não só importante, mas também uma referência para mim.

Era ela que, para além da minha mãe, estabelecia fronteiras e me ajudava a viver e a perceber a vida. E, a partir daí, embora estivéssemos poucas vezes juntas porque de transportes levava-se um dia inteiro a chegar a casa, as vindas da minha irmã eram sempre motivo de enorme alegria e felicidade. Apesar de eu ser uma adolescente, reorganizava a minha vida para poder estar o máximo tempo com ela. Lembro-me perfeitamente do prazer que sentia em nos sentarmos as duas a almoçar e a conversarmos horas sem fim. Os pratos deliciosos que a minha irmã cozinhava, a pensar no prazer que eu teria a comer. As sobremesas… ai as sobremesas. Ainda hoje são para mim as melhores do mundo. O molotov, a tarte de amêndoa, o bolo de chocolate. Tudo o que a minha irmã fazia e faz ainda hoje é divinal. Acredito que é por usar em grande quantidade o ingrediente mais valioso: o amor. Hoje é a minha filha que pede à tia para fazer o molotov e o meu filho pede a aletria. 

Mas voltando às minhas memórias, quando terminavam as minhas aulas do secundário, organizava-me sempre para ir passar uma semana com a minha irmã a Vila Real de Trás-os-Montes. Apanhava o Expresso às 8h no Campo Pequeno e chegava lá por volta das 17h. Ficava uma semana a partilhar quarto com a minha irmã, como acontecia em nossa casa. Esses dias eram muito importantes para mim porque sentia que a minha irmã era só minha. Que ela tinha todo o tempo para mim, embora, na verdade, não tivesse porque ainda estava com exames e frequências. Mas, eu sentia que eu era a grande alegria da minha irmã naquela semana e ela, sem dúvida, era a minha.  

Comia na cantina com ela porque não havia situação financeira para irmos a restaurantes, nem termos privilégios. Mas a verdade é que a minha irmã conseguia sempre poupar o suficiente durante o ano escolar, para que nessa semana pudéssemos ir tomar café ou lanchar. Fazer qualquer coisa que fosse um miminho que eu sabia que ela não tinha usufruído antes, para o poder partilhar comigo. Tudo ficou registado como provas de amor.

Esses gestos ficaram gravados como provas de amor.

E a partir daí eu fiz férias sozinha com a minha irmã, viajámos as duas já depois do nascimento da minha sobrinha e afilhada, a primeira bebé com quem eu tive a possibilidade de treinar o papel de mãe, e com a minha filha. Senti sempre esta proximidade muito grande da minha irmã. 

A minha irmã é uma grande referência para mim.

Ao longo da vida, nos vários momentos que cada uma de nós foi passando, a minha irmã representou sempre uma referência. Foi sempre um porto de abrigo. Foi sempre alguém capaz de me dar bons conselhos, de me cuidar e estimar. Uma pessoa que me ajudou a crescer e que me procurou continuar a dar as tais fronteiras. 

Eu tenho uma profunda admiração pela minha irmã, além de que tenho por ela um amor incondicional porque ela é uma pessoa de coração muito, muito nobre e muito, muito bom. É uma lutadora, uma guerreira, uma pessoa super resiliente e ao mesmo tempo uma mulher extremamente sensível e com uma inesgotável vontade de fazer sempre melhor. Mais: é uma mulher que luta para que os que ama estejam felizes. E eu revejo me muito nela. Para mim a minha irmã é uma heroína porque fez sempre dos muitos obstáculos da vida, isso mesmo, obstáculos para serem ultrapassados. Nela me inspirei e inspiro muitas vezes porque continua a ser uma grande referência para mim. Não só na forma como faço a gestão da minha vida, mas também na forma de amar os meus.

Amo-te muito minha irmã. 

Nota: Fotografia por Pau Storch e Sara Falcão

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