“Era uma vez…”
Seria assim a melhor forma de contar esta história. Contudo, neste caso, a história repete-se outra e outra vez, durante vários anos e afetando cada vez mais espécies e ecossistemas.
Sabes o que são os microplásticos?
De onde surgem e como afetam tão negativamente a vida humana e o planeta?
A verdade é que a grande viagem dos microplásticos no mar começa em cada objeto de plástico descartado, cada peça de roupa e cada produto de consumo que os tenha na sua composição.
A definição é simples: os microplásticos são esferas de plástico muito pequenas, resultantes da fragmentação de pedaços plásticos maiores – estas esferas plásticas têm menos de 5 milímetros de diâmetro (iguais ou menores aos grãos de areia da praia). Contudo, estes microplásticos são mais comuns do que seria de esperar: consegues encontrá-los na composição de vários cosméticos e produtos de higiene (desde pasta de dentes, esfoliantes, gel de banho, etc) – são estas esferas que lhes dão a espuma e textura de creme.
Estes microplásticos são ainda produzidos através da erosão de pneus ou lavagem de têxteis sintéticos nas nossas máquinas de lavar a roupa – os dois maiores produtores de microplásticos primários do mundo.
Mais do que em produtos, estudos indicam a existência de microplásticos nos peixes que comemos, no pó que respiramos, na água engarrafada que bebemos e até no próprio sal de cozinha que utilizamos.
Apesar destes microplásticos estarem em todo o lado, é possível dar o teu contributo à causa e conseguir fechar a torneira aos microplásticos.
Qual o problema em haver microplásticos no mar?
Se no mar mostram problemas sérios para as espécies e ecossistemas marinhos, estes microplásticos já não se ficam apenas pelos oceanos, estando mesmo, imagine-se, nos nossos pratos e cozinhados!
Porque devemos sempre saber a origem da nossa comida, descobre abaixo a longa viagem que os microplásticos fazem desde os objectos de plástico que utilizamos todos os dias até aos nossos pratos.
De onde surgem os microplásticos que comemos?
A história que vos conto de seguida em 700 palavras precisa de cerca de 1000 anos para acontecer (dependendo em muito do tipo de plástico de que falamos) – apesar de também existirem outras fontes e produtores de microplásticos para o oceano, 60 a 80% do lixo marinho é constituído por plásticos, que se fragmentam em milhões e milhões de pequenas partículas plásticas ao longo do tempo.
Produção dos produtos plásticos
Apesar de serem vários os tipos de plástico existentes, todos eles são criados a partir de resinas derivadas do petróleo que se ligam e agrupam em polímeros. Estas moléculas são processadas em pellets de polímeros, fundidos e transformados num líquido plástico que é depois utilizado nos mais diferentes moldes possíveis e imagináveis – garrafas descartáveis, copos, pratos, talheres, brinquedos e outros objetos comuns.
Na extração e transporte destes componentes de base fóssil, são libertados para a atmosfera químicos tóxicos como Benzeno, COV’s e mais de 170 resíduos químicos do processo de perfuração: ao serem inalados por humanos, prejudicam o sistema imunitário humano, aumentam risco de cancro e incidência de problemas neurológicos.
Consumo dos produtos plásticos
Depois dos produtos fabricados, são transportados, rotulados e colocados à disposição de todos nas mais diversas lojas e supermercados (exceto no nosso mercado de produtos sustentáveis, aí não entram com facilidade!). Alguns destes produtos plásticos colocam quem os utiliza em contacto com metais pesados, “possíveis” cancerígenos e até microplásticos de forma direta – a água engarrafada, por exemplo, contém, em média, 22 vezes mais microplásticos do que a água da torneira.
Depósito e tratamento dos resíduos
É aqui que a tua decisão é importante para mudar o destino dos resíduos plásticos.
A primeira opção é, sempre, reciclar o plástico que conseguires. Desde os anos 50 foram descartados cerca de 4600 milhões de toneladas. Desses, apenas 600 milhões de toneladas foram recicladas (pouco mais de 10% de todos os plásticos alguma vez descartados)! Ao seguirem para a reciclagem, os produtos plásticos são agrupados em blocos, desfeitos, lavados, fundidos e aplicados em novos produtos e materiais.
Se apenas 10% do plástico descartado no mundo chegou a ser reciclado, a percentagem de plásticos que acabaram por ir parar a aterros é bem maior – 12% dos resíduos plásticos foram incinerados, enquanto 79% foi colocado em aterro ou ao relento no meio ambiente. Estes plásticos em aterro misturam-se com outros tipos de resíduos e, por ação da água da chuva acumulada, acabam por criar o chorume (também conhecido como lixiviado). Este líquido, produzido pela reação da água acumulada e os componentes tóxicos solúveis dos plásticos, acaba por contaminar os solos próximos e canais freáticos, “envenenando” muitos ecossistemas e espécies.
Se estes resíduos plásticos forem mal depositados ou deixados ao relento, é muito provável que o destino desse resíduo plástico seja o mar. Ao ser arrastado por um afluente, o plástico vai seguir para um rio que vai desaguar, inevitavelmente, no mar e ser levado pelas correntes marítimas para zonas de acumulação.
“Mas, estes resíduos que não são deitados nem no ecoponto, nem no lixo comum são muito poucos de certeza…” Na realidade são 8 milhões de toneladas de plástico que todos os anos vão parar aos nossos oceanos, o mesmo que um camião de carga cheio por minuto! Estes resíduos plásticos de maiores dimensões acabam por se acumular nos mesmos pontos marítimos – como é o caso das ilhas de plástico do pacífico – tornando difícil a vida de muitas espécies marinhas.
Alimentação de espécies marinhas
Estudos indicam que resíduos plásticos e microplásticos são ingeridos por organismos marinhos em todos os níveis da cadeia alimentar. Mesmo que te pareça curioso o facto da tua garrafa descartável poder ser alimento para outras espécies, este tipo de resíduos nos oceanos é responsável pela morte de muitos animais marinhos – muitos deles morrem sufocados, com fome ou envenenados pela toxicidade destes materiais.
Para além de espécies marinhas como tartarugas ou aves, que ingerem partículas plásticas de maiores dimensões, quando estes resíduos se separam em microplásticos, todos os peixes, independentemente do tamanho, são afetados.
Alimentação para nós, humanos.
A partir do momento em que os microplásticos entram na cadeia alimentar, não há volta a dar – sendo estes plásticos não degradáveis, acabam por percorrer toda a cadeia alimentar, levando consigo todos os tóxicos e problemas associados. É simples: se o peixe-lanterna se alimenta de microplásticos, o choco come o peixe-lanterna, o atum come o choco, e nós, humanos, comemos atum, é fácil perceber a lógica e o porquê das várias notícias que associam microplásticos à saúde humana.
Seja a presença de microplásticos em fezes humanas, no ar que respiramos, no sal que consumimos ou mesmo, de forma geral, a quantidade de plástico que estamos a consumir sem noção – um estudo recente descobriu que os seres humanos estão a ingerir cerca de 5 gramas de plástico por semana, o suficiente para fazer um cartão de crédito. As consequências deste consumo para a espécie humana são claras, com o aumento do risco de cancro, asma, infertilidade e distúrbios mentais associados ao consumo de microplásticos que nos chegam através do consumo.
Como posso evitar os microplásticos na cadeia alimentar?
Para evitar que os microplásticos sejam um problema, há muito pouco que se pode fazer – ao longo dos anos colocámos tanto plástico nos oceanos que será complicado algum dia nos livrarmos completamente dele… Neste momento, o que podemos fazer para atenuar este problema é mudar a forma como consumimos estes produtos: recusar, reduzir e optar pelas alternativas sustentáveis ao plástico (que já são muitas e nada discretas).
Contudo, cuidado com os novos bioplásticos, plásticos biodegradáveis ou compostáveis – apesar de realmente inovadores no processo de produção, ainda estão numa fase muito inicial, não existindo ainda sistemas de tratamento acessíveis em Portugal e exigindo uma grande quantidade de recursos para serem produzidos.
Algumas destas alternativas sustentáveis são optar por garrafas reutilizáveis em vez de copos descartáveis, substituir sacos plásticos por sacos reutilizáveis de rede para fruta, optar por cotonetes biodegradáveis ou, em caso de não conseguires deixar o plástico por completo, colocar os resíduos no ecoponto, reciclando o máximo possível.
A grande mudança só surgirá quando os plásticos começarem a ser pensados para a reutilização, promovendo a redução e garantindo um sistema eficiente e fácil de recolha e tratamento destes resíduos.