Já corri o que tinha a correr

Fátima Lopes // Abril 2, 2024
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Ao ler um artigo do jornalista Rui Gustavo no jornal Expresso sobre o espírito da maratona, dei por mim a recuar no tempo até à minha época de atleta de competição. Entre as várias fotografias que ilustram o artigo estão as de Carlos Lopes e Rosa Mota quando ganharam a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos e que foram a minha inspiração e a de muitos outros atletas na época. 

Bem me recordo de, em 1984, ficar acordada à espera da participação de Carlos Lopes na maratona dos Jogos Olímpicos de Los Angeles. Quando saíram os jornais diários com o atleta português a ocupar a capa inteira como um herói nacional apressei-me a fazer de uma dessas capas um poster para o meu quarto. 

Eu era velocista, o que nada tinha a ver com os fundistas, mas o amor às corridas estava lá. 

O desporto de competição, como era praticado nos clubes naquela época, sem recursos financeiros nem condições, como era o caso do meu clube, exigiam não só total entrega, como também um enorme espírito de sacrifício. Não digo que hoje quem compete se sacrifique menos. De maneira alguma. Só que não existia o conhecimento que existe hoje sobre as necessidades e condições para um atleta poder investir na competição e, por isso, muito dependia da resiliência de cada um e das condições, a vários níveis, para termos boas performances. 

Recordo-me que durante alguns anos corri com ténis totalmente desadequados, mas eram os que os meus pais podiam comprar. 

A pista onde treinávamos era de cinza quando foi inaugurada, mas foi-se degradando com os anos e na minha época era praticamente de terra batida, o que para quem treinava velocidade com sapatos de bicos, era um verdadeiro tormento. 

Lesões foram mais que muitas. A que mais me incapacitou foi uma lesão nos músculos isquiotibiais das duas pernas e que me provocou um sofrimento prolongado. Mesmo assim não quis deixar de competir e a fatura ainda hoje a estou a pagar. 

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Em 1988, ano em que o meu ídolo Rosa Mota  ganhou a medalha olímpica da maratona em Seul, eu despedia-me do desporto de competição. 

A entrada na faculdade em Lisboa não era compatível com treinos diários no Barreiro. Esse primeiro ano sem competição foi muito difícil. Sentia-me perdida, depois de 5 anos tão dedicados às provas. Quando conseguia ia ao clube mas apenas para fazer umas corridinhas com os meus colegas. 

Aos 20 anos os meus pais foram viver para Brejos de Azeitão e eu fui com eles. Com muita pena minha, o clube e os amigos do atletismo ficaram para trás porque não tinha forma de os ir visitar. 

Passado um ano comecei a correr sozinha na estrada. Fazia 14 km duas vezes por semana. Ao fim de dois anos saturei-me e fui à procura de um ginásio para começar uma nova atividade física. 

Nunca mais voltei a correr de forma regular. 

Fiz várias tentativas, mas concluí que não conseguia simplesmente porque já não tinha nenhum prazer em correr. Admiro quem o faz porque sei que não é fácil. Às vezes é até muito doloroso. Quanto a mim já corri o que tinha a correr.

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