Infertilidade no feminino

Luis Ferreira Vicente // Abril 24, 2020
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Por uma questão de organização de ideias, costumamos dividir as causas de infertilidade em causas femininas, masculinas e mistas. Mas, na vida real, quando queremos investigar a razão de a gravidez não acontecer, temos sempre de avaliar o casal simultaneamente.

Felizmente, a maioria dos parceiros compreende que há passos que têm de ser dados simultaneamente e não apenas pela mulher, que durante muitos anos foi a pessoa que com maior frequência procurava uma solução para um problema de infertilidade do casal.

Para compreendermos o que está subjacente ao facto de a gravidez não acontecer, temos de perceber o que ocorre durante a ovulação, fertilização e implantação.

O que ocorre durante a ovulação, fertilização e implantação?

O organismo está muito bem orquestrado de forma a que, durante o ciclo menstrual, o ovário, o endométrio no útero e o muco cervical estarem sincronizados. Isso é conseguido pelas hormonas produzidas no ovário, durante o período em que o folículo cresce até ocorrer a ovulação. 

Interação entre as hormonas, ovário e endométrio

À medida que se aproxima a ovulação, o muco do colo torna-se mais permeável, e o endométrio mais espessado para estar pronto para a fase de implantação.

A ovulação ocorre a meio do ciclo e o óvulo é captado pela trompa. Nessa altura, o muco do colo que, durante a maior parte do ciclo é espesso e impermeável, permite a passagem dos espermatozoides. Estes caminham até à trompa, onde encontram o ovócito e o fecundam. 

Ovulação, Fertilização e Implantação

Nos dias seguintes, o embrião vai iniciar as primeiras divisões celulares e vai percorrer a trompa em sentido inverso, em direção ao útero.

Ao 5º/6º dia atinge a cavidade uterina e vai implantar-se no endométrio, continuando a dividir-se, dando origem à futura placenta, que irá ligar-se com a circulação materna.

São todos estes passos que devemos investigar quando a gravidez não acontece de forma a que, ao corrigi-los, a gravidez surja.

Ovulação

Podem ocorrer ciclos anovulatórios (sem ovulação). Quando isso acontece, os  ciclos são muito longos (ou seja, o espaço entre as menstruações é maior que 35 dias). 

É frequente ocorrer a síndrome dos ovários micropoliquísitcos. Esta é a alteração mais frequente nas mulheres em idade fértil. Com a presença de múltiplos microfolículos (microquistos), o ambiente hormonal não permite que nenhum se desenvolva e torne dominante para que a ovulação ocorra.

Como se corrige?

Com medicamentos indutores da ovulação. Estes podem ser em comprimidos, como o citrato de clomifeno, ou o letrozol, ou com medicamentos injectáveis.

Num primeiro ciclo é conveniente fazer-se uma monitorização ecográfica para se perceber o seu efeito e se excluir o risco de resposta excessiva com risco de gravidezes gemelares.

Trompas não permeáveis

Quando a gravidez não acontece apesar de ciclos regulares, com sintomas pré-menstruais (tensão mamária, alterações do humor…) que são sugestivos que a ovulação ocorre, temos de excluir a possibilidade de as trompas não estarem funcionantes ou permeáveis.

Como as trompas não são visíveis numa ecografia simples, temos de colocar um contraste no seu interior para as conseguir observar. Esse contraste pode ser visível com RX, num exame chamado histerossalpingografia, ou visível numa ecografia, num exame chamado histerossonosalpingografia. 

Antes da sua realização é necessário que seja excluída uma alteração espermática no parceiro. Se o exame masculino estiver bem, existe uma elevada taxa de gravidez espontânea nos 3 a 6 meses após este exame. Julga-se que o contraste consiga desobstruir as trompas, por um efeito mecânico ou por alterar a mobilidade da trompa que facilita a ocorrência da gravidez.

Por vezes, não é possível desobstruir as trompas e há então a indicação para fertilização in vitro ou para cirurgia, em que se pode reverter um processo aderencial.

Cavidade uterina

Por vezes, pode existir alteração da cavidade uterina, por pólipos ou miomas, como é o caso da imagem de histerossalpingografia, em baixo, em que há um defeito de preenchimento do bordo da cavidade uterina.

Imagem de Histerossalpingografia: Trompas com permeabilidade, mas imagem de subtração no bordo esquerdo do útero

Nestas situações, há a indicação para a realização de uma histeroscopia, em que se

entra com uma câmara muito pequena, de fibra óptica, no interior da cavidade uterina. Por esta via, podemos remover o pólipo ou mioma e restabelecer a anatomia da cavidade uterina e favorecer a implantação.

Imagem de pólipo endometrial numa histeroscopia correspondente à imagem de subtração da figura anterior

Endometriose

A endometriose é uma doença benigna que afeta 1 em cada 10 mulheres. Caracteriza-se pela ocorrência de menstruações dolorosas, por vezes mesmo incapacitantes. O melhor diagnóstico ou suspeita é feito por se ouvir o que as doentes nos contam. Resulta da presença de tecido endometrial, que habitualmente reveste o útero, fora deste.

Num terço das doentes com endometriose a infertilidade pode estar presente, pelo que devemos ter na nossa mente a sua causa na não ocorrência de gravidez associada à presença de dor durante a menstruação.

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