Quando me vi obrigada a vir para casa, para poder assegurar a quarentena do meu filho e, ao mesmo tempo, todas as responsabilidades da casa, acreditava que me ia sobrar muito tempo livre. Achava até, ingenuamente, que iria fazer algumas das mil e uma coisas que no dia a dia não consigo fazer. Nada mais errado.
O meu filho veio para casa cumprir a sua quarentena e a escola veio com ele.
O que é que isto quer dizer? Que tinha a primeira aula online às 9h10 e depois seguiam-se outras ao longo do dia, ficando nos intervalos com tarefas para cumprir. Acontece que, aos 11 anos, a generalidade das crianças ainda não é tão autónoma como gostaríamos e o meu filho encaixa-se nesta realidade. Isto tem implicado da minha parte, desde o primeiro dia em casa, muito tempo disponível para acompanhar as suas actividades escolares, monitorizar e pôr ordem, quando a vontade dele é pouca, e pedir ajuda aos outros pais sempre que surgem dificuldades que não consigo ultrapassar sozinha.
Dei por mim a ter o dia quase todo ocupado no papel de professora/educadora.
A tarefa torna-se ainda mais exigente porque os garotos têm dificuldade em sentir que não estão de férias! Essas só começam agora.
A acrescentar a tudo isto, há uma casa para gerir, compras de bens alimentares que só podem ser feitas por mim, porque sou a única pessoa que sai de casa, a preparação das refeições, das roupas, a limpeza da casa e ainda o acompanhamento da família que está longe, mas que queremos assegurar que esteja bem.
Eu que achava que ao acordar iria fazer sempre uma pequena meditação, era surpreendida pelo meu filho, que acordava antes de mim e aguardava a minha companhia para o pequeno-almoço…
Ganhei o pequeno-almoço diário com ele. Deixei a meditação matinal para trás. Os muitos textos que estavam agendados para entregar durante o mês de Março, foram sendo reagendados por não os conseguir escrever. A caminhada que pensava fazer perto de casa, ficava muitas vezes sem efeito, porque tinha de fazer o almoço a horas de o Filipe ter a aula das 14h… Enfim, conseguimos parar a rotina louca do dia a dia. É verdade. Mas, acumulámos todos os papéis dentro de casa: Mãe, educadora, professora, empregada de limpeza/gestora da casa, cozinheira, profissional em regime de teletrabalho. É muito cansativo.
Há inúmeras pessoas a fazer vídeos, posts, diretos com ideias para ocupar o tempo. Bom, eu não sei se é ineficiência minha, mas não cheguei aí. Tenho montes de ideias de coisas para fazer com os meus filhos e sem eles, mas sinto que apesar de me esticar imenso, não consigo chegar a todo o lado.
Não me estou a queixar. Estou só a relatar a minha vivência. A sua pode ser completamente diferente.
Acredito que nada acontece por acaso. Tudo tem um propósito e encerra várias lições. Por exemplo, os meus filhos veêm, uma vez mais, que a mãe é multifacetada e capaz de manter, nesta conjuntura, o barco a navegar em águas tranquilas e com rumo. Por sua vez, eu sinto a segurança de quem sabe que encontrará sempre a solução para as várias situações que a vida nos presenteia.
As refeições ganharam valor acrescido enquanto lugar de partilha. As conversas permitiram não ficar pelas meias respostas. Vamos até ao fim do tema. E, apesar de estarmos juntos, temos saudades. Saudades de nos abraçar, de nos beijar e de abraçarmos os que amamos e queremos bem.
Continuamos a olhar para o calendário, mas agora fixados na data do fim da quarentena ou das previsões do fim do isolamento social.
É meia noite e estou ainda a escrever este texto. Uma vez mais esperei pelo silêncio da casa para mergulhar nas palavras. Eu que achava que agora iria escrever sempre que sentisse vontade. Que ia meditar muitas vezes ao dia e fazer deste tempo uma espécie de retiro espiritual.
Meditar muitas vezes ao longo do dia, não passou de uma ilusão. Agora retiro é, mas muito diferente de todos os que já fiz. É um retiro de crescimento acelerado das famílias. E, só por isso, já estou já profundamente agradecida.
Nota: Fotografia por Verónica Silva