E tu queres morrer? Sim? Não? Talvez?
Antes da pergunta falta a educação para a morte.
A pergunta é simples: a eutanásia deve ser legal? Sim ou não? Mas, sabes o que me deixa preocupada? Não é a simplicidade da pergunta. É a resposta simples que estás disposta a dar. Ou sim, e és a favor da morte medicamente assistida. Ou não, e és contra o ato consciente de pôr fim à vida. E já está! Acabaste de pôr a vida a preto e branco. Fosse assim tão fácil, não é?
Consegues? Viver a tua vida a preto e branco?
Consegues-me dizer honestamente que todas as decisões que tomaste na tua vida até agora foram o resultado de uma data de sins e nãos? Pois, também me parecia!
A vida tem mais cores.
Tem dias que parecem uns verdadeiros arco-íris. Tem outros que são a nova edição das cinquenta sombras de cinzentos. (Mas, daqueles negros, mesmo, nada como aqueles do cinema…) São mais de mil cores.
Viver é a soma de muitos talvez. Os degradés que ficam entre o sim e o não. Aqueles que tens de esgotar até ficar nítida a cor que queres. E na verdade, nesta pergunta, os talvez não estão aqui contemplados.
Talvez se os profissionais de saúde tiverem formação e treino para lidar com as consequências (profissionais, pessoais, emocionais) do ato de pôr fim à vida. Talvez os familiares não consigam aceitar essa decisão, sujeitando-os a períodos de luto mais sofridos e mais prolongados no tempo. Talvez se cada um de nós conseguir dizer a si mesmo o que é uma boa morte. Consegues? Eu não! E olha que ando nisto da perda e do luto há mais de dez anos. E sabes o que aprendi ao escutar centenas de histórias de vida? Que a morte é tabu. É irreversível. É desconhecida. É final. E por isso, não se fala dela. Então, como podemos perguntar ao mesmo povo que foge da morte, sobre a legalidade da morte consciente?
Despenalização da eutanásia: sim ou não?
Sabes, é mais fácil responder a uma pergunta que não é sentida por dentro. A morte consciente, enquanto abstração, deve ser legal? Sim, claro, é um direito que assiste a cada um de nós! Não, claro que não, é violar a preciosidade da vida humana. E, no entanto, eu só te consigo dizer: depende! Depende dos talvez! Os talvez dos médicos que vão pôr fim à tua vida, os talvez dos que te amam que não tiveram direito a opinião, os teus talvez sobre o motivo de quereres morrer.
Antes da pergunta, falta educação para a morte.
Uma boa maneira de começar é pessoalizares a pergunta. E se fosse contigo? E se fosse a tua morte? Só depois poderás fazer a pergunta certa. E eu, quero morrer? Não sei! Depende. No meu caso, o que sei é que não pode depender só de mim. Deve ser um direito meu. Se calhar!… Mas, eu é que fico morta. Os que me sobrevivem é que vão ter de continuar a viver uma vida, cheia de talvez, a ruminar nos e ses, a preencher telas que agora têm espaços em branco. Deve ser um direito meu, que termina onde começa o direito do outro, aquele que fica cá, a continuar a viver num mundo onde eu já não estou.
Antes de responderes, pergunto-te, estás a fazer a pergunta certa?
Sabe mais aqui.