Descascar mais e desembalar menos: pequenas mudanças para ganhar saúde

Joana Moura // Julho 18, 2022
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A pressão de uma sociedade e vida aceleradas têm contribuído para a alteração de estilo de vida e da forma como nos alimentamos. Vivemos num ambiente obesogénico, onde se procura o rápido, o fácil e o barato, que na maior parte das vezes não nutre, nem promove saúde. A grande maioria das pessoas ingere poucos alimentos nutritivos no seu estado mais natural, mais ricos em fibras e densos em nutrientes.

A industrialização facilitou-nos a vida em muitos aspetos, mas veio também alterar muitos hábitos alimentares, a forma como comemos, os ritmos, os hábitos e o estilo de vida. Há uma centena de anos a nossa alimentação era muito diferente: comíamos o que se plantava, colhia e criava. Seria, aliás, muito estranho para os nossos trisavós comer algo que viesse dentro de uma caixa, pacote ou embalagem. Hoje o paradigma mudou e, se sugerirmos a alguém que retorne ao que faziam os nossos antepassados, ou seja, basear a alimentação em produtos frescos e naturais, deixando de lado tudo o que vem empacotado e pronto a comer, a reação frequente é de resistência, insegurança e não é raro ouvirmos: “Mas então o que é que eu vou comer?” ou “Como se cozinha esta alimento?”.

As mudanças nos hábitos, no estilo de vida, na alimentação, assim como o aumento da tecnologia e a menor atividade física, trouxeram consequências à saúde da população em geral. 

Atualmente, estima-se que uma alimentação desequilibrada e desajustada seja o principal fator responsável por uma em cada cinco mortes prematuras nas últimas décadas, sendo igualmente a causa de doenças crónicas não transmissíveis, que tem na sua base fatores de risco comuns que podem ser modificáveis.

O nosso organismo funciona da mesma maneira que o dos nossos antepassados, sabe lidar melhor com a escassez do que com a abundância, mas agora está exposto a um ambiente completamente diferente. 

O que antes constituía uma vantagem competitiva e que nos permitiu resistir a tempos de escassez, leva‑nos agora a doença com a abundância de hoje carregada de alimentos hiperpalatáveis, ricos em energia, pobres em nutrientes e pouco saciantes.

Proponho que desembale menos, descasque mais e faça a base da sua alimentação com alimentos o mais próximo do seu estado in natura

Estes alimentos não têm rótulos, não tem lista de ingredientes. Estes são os alimentos fora da caixa, obtidos diretamente de plantas ou animais, alimentos naturais e frescos, que são perecíveis, como a carne, pescado, ovos, vegetais, tubérculos, frutas, frutos secos e sementes. Por que é tão importante fazermos isto? Porque é a estes alimentos que estamos biologicamente adaptados, são estes alimentos que nos nutrem, conferem saciedade e não impactam com o nosso metabolismo. Uma vez estabelecida a base da alimentação, há espaço ainda para alguns alimentos que a indústria alimentar tão convenientemente nos oferece, e que sofreram algum processamento, mas que não afetam o nosso metabolismo de forma prejudicial. Há alimentos processados que são compatíveis com uma alimentação saudável, mas é importante saber escolhê-los e distingui-los. São alimentos que derivam diretamente de alimentos in natura e que sofreram algum tipo de processamento, como a pasteurização do leite, extração do azeite, peixe em conserva de pescado, o queijo, etc..

Como nos podemos manter saudáveis ao longo da vida?

Procure substituir de vez os alimentos ultraprocessados e vá construindo uma despensa mais saudável.

Alimentos que devemos ter presentes na nossa despensa e alimentação semanal:

. Proteína de alto valor biológico

Compre sempre que possível carne, peixe, ovos e lacticínios biológicos, de animais criados em pastagens ao ar livre, sem produção intensiva, sem alimentação com transgénicos, hormonas e antibióticos. Em relação aos peixes, preferencialmente selvagens ou criados em viveiros certificados.

  • Carne de animais que pastaram (criados em pasto ao ar livre);
  • Aves biológicas;
  • Peixe selvagem ou de viveiro certificado;
  • Ovos biológicos;
  • Proteína vegetal rica em fibras (pseudocereais e leguminosas);
  • Iogurtes: grego, kefir (feitos de preferência a partir de fermentação de leite biológico de cabra ou ovelha).

. Gorduras boas

  • Sementes: chia, girassol, linhaça, abóbora, sésamo…;
  • Abacate, óleo de abacate;
  • Azeite e azeitonas (atenção às azeitonas pretas ou mais escuras, que são tingidas artificialmente);
  • Coco, óleo de coco, leite de coco;
  • Ghee;
  • Frutos secos, manteigas de frutos secos.

. Hidratos de carbono complexos (em porções adequadas ao seu estilo de vida)

  • Pseudocereais e aveia (especialmente aveia em flocos sem glúten, quinoa, amaranto, sarraceno, teff, millet ou milho painço);
  • Arroz preto, vermelho, castanho ou selvagem;
  • Batata-doce, mandioca, inhame;
  • Abóboras, cherovia, nabos, cenouras;
  • Leguminosas: favas, ervilhas tortas, ervilhas de quebrar e leguminosas cuja digestão seja fácil (a escolha das leguminosas deve ser muito individualizada e determinada caso a caso). Cozinhe as leguminosas sempre de forma funcional: demolhadas várias horas, lavar, mudar as águas e cozinhar com alga kombu.

. Alimentos ricos em fibras

  • Frutas: todas as frutas frescas e congeladas de menor carga glicémica e sem adição de açúcar, especialmente frutos vermelhos (morangos, mirtilos, framboesas, amoras, groselhas), maçãs, peras, laranjas, limões, limas, abacates, maracujá, romã, kiwi, melancia;
  • Todos os vegetais: folhosas verdes (alfaces, canónigos, espinafres, nabiças, grelos), aipo, abóboras, couves, curgete, pepino, nabo, brócolos, couves de Bruxelas, espargos, cenouras, cebola;
  • Leguminosas: favas, ervilhas tortas, ervilhas de quebrar e leguminosas cuja digestão seja fácil (a escolha das leguminosas deve ser muito individualizada e determinado caso a caso). Devem ser sempre cozinhadas de forma funcional: demolhadas várias horas, mudar as águas e cozinhar com alga kombu;
  • Frutos secos e sementes (especialmente pistácios e amêndoas);
  • Pseudocereais e aveia (especialmente aveia em flocos sem glúten, quinoa, amaranto, trigo sarraceno, teff, millet ou milho painço). 

. Ervas e especiarias (estas são as mais interessantes do ponto de vista funcional, mas podem usar todas as que gostarem)

  • Canela do Ceilão (a canela verdadeira);
  • Açafrão da Índia ou Curcuma;
  • Pimenta-caiena; pimenta preta;
  • Alho;
  • Manjericão, hortelã, coentros, salsa, alecrim, tomilho;
  • Gengibre;
  • Orégãos.

. Alimentos diversos

  • Cacau cru;
  • Vinagre de cidra com “Mãe” (este não é pasteurizado e tem probióticos vivos);
  • Chá verde biológico;
  • Café biológico;
  • Algas marinhas (nori, kombu, arame, kelp, etc.).

Como fazer algumas alterações simples para mudar para uma cozinha e alimentação mais saudáveis?

AlimentosSubstitua por…
Carne de criação intensiva e processada / peixe de pesca não sustentável; ovos de produção intensiva Carne de pastagem e sustentável; peixe proveniente de pesca sustentável ou com certificado (GNN – Certified Farming ASC; ASC- Aquaculture Stewardship Council ou MSC- Marine Stewardship Council); ovos biológicos – tipo 0 
Entradas e pãoSopa de vegetais variados incluída em todas as refeições
Batata frita, arroz branco, massa de trigoAcompanhamentos como: vegetais diferentes (pelo menos três) a acompanhar as refeições principais; pseudocereais; arroz vermelho, castanho ou preto, quinoa, amaranto, aveia em grão, millet, trigo-sarraceno
Leguminosas enlatadasCozinhar as leguminosas de forma funcional
Iogurtes adoçados e aromatizados, iogurtes magros e lightLaticínios fermentados (queijos e iogurtes naturais), iogurte feito em casa (que tem mais probióticos ativos) 
Maionese de compraMaionese caseira (com azeite virgem extra ou óleo de abacate de extração por pressão a frio)
Gorduras processadas a altas temperaturas e refinadas, de soja, milho, girassol, canola, palma…Gorduras de boa qualidade: azeite virgem extra, óleos de extração a frio: de abacate, coco de sementes e frutos secos 
Sal refinado de mesaEvite o excesso de sal, substituindo-o pela utilização de especiarias e ervas aromáticas; usar sal marinho integral ou flor de sal como tempero final, em menor quantidade
Alimentos fritos, grelhados no carvão, assados a altas temperaturasAlimentos cozinhados a vapor, salteados rápidos, cozinhados de forma lenta em estufados ou guisados (por exemplo, numa panela slow cooker
Açúcar brancoAdoçantes naturais de menor impacto na glicémia e de uso ocasional (deverão ser uma exceção, não a “normalidade”) 
Pão branco industrializado, feito com farinhas refinadas, fermentações químicas e rápidasPão feito em casa ou de compra de fermentação lenta, fermentado com “massa mãe” 
Trigo e cereais processados e refinadosCereais antigos e integrais, substituições por farinhas alternativas (completas, integrais) 
Bolachas e snacks empacotados; cereais de pequeno-almoçoFruta; queijo; frutos secos; ovos; bolachas / tostinhas caseiras
Sumos e refrigerantes empacotadosÁgua; águas aromatizadas (com canela, rodelas de citrinos, frutos vermelhos), chás, tisanas e limonada (sem adição de açúcares)

Alimentação fora da caixa, descascar mais e desembalar menos

No meu livro “Alimentação Fora da Caixa, descascar mais e desembalar menos”, quero ajudar a mudar a forma como se alimenta, e com isto ganhar saúde, mas não pretendo complicar‑lhe a vida. A minha proposta é a de que esta nova forma de se alimentar se torne um hábito, que haja não só uma mudança, mas uma efetiva transformação. Os nossos hábitos fazem parte de um piloto automático criado pelo nosso cérebro para nos poupar trabalho, em que já não pensamos no que fazemos nem porque o fazemos, simplesmente já o fazemos há tempo suficiente para se ter automatizado. A nossa evolução deu-se pela conservação da energia, por isso é tão difícil mudar de hábitos, pois é preciso repensar no que vamos fazer e o nosso corpo opõe sempre resistência às mudanças.

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Todas as pessoas abraçam a mudança de forma diferente. Cada um tem de encontrar a sua motivação, perguntar a si próprio como se quer sentir, como quer estar, que tipo de energia quer ter, menos stress e menos ansioso quer estar, para estar mais presente connosco mesmos e com a nossa família e amigos. Temos que identificar qual o nosso “Porquê?” e usarmos essa motivação interna para todos os dias trabalharmos na criação e construção de novos e melhores hábitos. 

O sucesso vem de criarmos um hábito saudável e o repetirmos vezes sem conta, pois nada acontece da noite para o dia. 

Seja persistente, consistente e resiliente. O processo deve ser uma maratona e não um sprint! Quanto mais pequenas mudanças, mais frequentes e aos poucos as fizermos, mais consistentes nos tornamos. Exemplos muito simples do que pode começar já por fazer: melhorar os pequenos‑almoços, introduzir sopas ou mais legumes nas refeições principais. Fazer algo por duas semanas, depois mudar novamente algo, mais duas semanas… e com o acumular de pequenas mudanças, vai construindo uma mudança maior, a caminho de uma transformação de estilo de vida. Para que a mudança se torne consistente é preciso vontade de mudar e depois vem a repetição, repetição, repetição… Com o conhecimento saberá ao que dar prioridade na sua alimentação, com o planeamento das refeições poupará energia mental e tempo, e com a repetição será possível automatizar comportamentos, tornando-os em hábitos rumo a sua saúde.

Agora vamos lá colocar as mãos na massa e começar as fazer mudanças…

Receitas: 

[Estas são duas sugestões do livro “Alimentação fora da caixa”.]

. Sopa rica de peixe

Doses: 8

Dificuldade: 1

Tempo: cerca de 1 hora

Ingredientes: 

Caldo de peixe

  • 1 cabeça de garoupa ou de outro peixe ou marisco adequado para caldo (por exemplo, corvina, solha, pescada, cabeças de camarão);
  • 2 l de água;
  • 1 talo de alho-francês;
  • 1 molho de coentros/salsa;

Tomatada

  • 1 folha de louro;
  • 4 dentes de alho;
  • 1 cebola;
  • 250 g de tomate pelado;
  • 300 g de lombinhos de peixe branco ou outro;
  • 400 g de ameijoas e de camarão (opcional);
  • 1 curgete espiralizada;

Para servir

  • 1 lima;
  • 1 abacate;
  • 1 molho de coentros frescos.

Modo de preparação: 

  1. Para o caldo de peixe, coloque todos os ingredientes no tacho. Deixe fervilhar em lume baixo cerca de 45 minutos. Se se formar espuma, vá retirando cuidadosamente e descartando;
  2. Quando o caldo estiver pronto, coe‑o com um passador de rede e reserve o líquido;
  3. Para a tomatada, refogue a cebola com o louro e o azeite;
  4. Junte o alho e deixe alourar;
  5. Adicione o tomate e deixe cozinhar por 5 minutos;
  6. Retire o louro e reduza a puré com a varinha mágica. Reserve;
  7. Num tacho em lume médio, aqueça o caldo de peixe e adicione a tomatada;
  8. Junte os lombinhos e, se pretender, as amêijoas e os camarões;
  9. Quando o peixe estiver cozinhado, adicione a curgete espiralizada e deixe cozinhar apenas 2 minutos;
  10. Sirva a sopa rica com uns cubinhos de abacate e coentros picados. Adicione ¼ de lima para espremer na altura de servir.
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. Salada de meloa, melancia e melão

Doses: 6

Dificuldade: 1

Tempo: 10 minutos

Ingredientes: 

  • 300 g de melão;
  • 300 g de meloa;
  • 300 g de melancia;
  • 250 g de mozarela mini;
  • 150 g de presunto em fatias finas;
  • Hortelã e manjericão q.b.

Modo de preparação: 

  1. Prepare a fruta, bem fresca, com o utensílio específico para retirar a polpa na forma de uma pequena bola do tamanho da mozarela;
  2. Vá alternando a fruta numa taça larga. Misture também o queijo e as lascas finas de presunto;
  3. Para terminar distribua folhas frescas de hortelã e manjericão.
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