De namorado/marido a pai

Cláudia Morais // Abril 9, 2024
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de namorado marido a pai
de namorado marido a pai

O que muda num homem quando se torna pai? O que muda na forma como uma mulher olha para o namorado ou marido quando ele abraça a paternidade? Porque é que essa transição da vida a dois para a vida a três é tantas vezes desafiadora? Porque é que há tantas separações nos primeiros três anos de vida de um primeiro filho?

Não há dúvidas de que o casal sofre uma das maiores transformações quando nasce o primeiro filho. Por muito desejado e planeado que esse bebé seja, ninguém pode prever com exatidão tudo o que vai mudar, sobretudo do ponto de vista emocional. E se esta transição acarreta muitas emoções intensas e muitas expectativas tanto para o homem como para a mulher, a verdade é que as jornadas são muitas vezes diferentes.

A maior parte das mulheres pode sentir o instinto maternal praticamente desde a puberdade, enquanto muitos homens levam mais tempo a encaixar todas as peças que envolvem o papel parental no gigantesco puzzle em que as suas vidas se transformam.

Não raras vezes, eles sentem que a sua vida mudou drasticamente, que passaram a assumir muito mais responsabilidades do que estavam habituados a ter e que, ainda assim, estão a ser injustamente criticados, enquanto elas se sentem sobrecarregadas e desamparadas. Quem tem razão? Por norma, os dois.

Lembra-se de quando aprendeu a conduzir? 

Algumas pessoas adquiriram esta habilidade muito antes de fazerem 18 anos. O interesse, o gosto ou o incentivo dos adultos pode ter feito com que tenha aprendido a conduzir ainda adolescente. Nesse caso, tirar a carta foi uma simples formalidade. Ou então a sua realidade foi outra – nunca pegou num carro até se inscrever numa escola de condução e as primeiras viagens sozinho(a) foram carregadas de nervosismo e hipervigilância.

Com o papel parental é mais ou menos a mesma coisa. 

A chegada de um primeiro filho vai envolver muitas aprendizagens e adaptações e é com a prática que nos tornamos mais ágeis e, consequentemente, mais disponíveis para as outras áreas da nossa vida. Como mãe de dois filhos, costumo relatar a minha experiência nas minhas consultas: durante o primeiro ano de vida do meu primeiro filho não me lembro de ter visto nenhum filme ou série. Sentia que não tinha tempo para nada. Quando a minha filha nasceu, o meu filho só tinha 3 anos e, ainda assim, eu sentia que tinha tempo para tudo! Era a prática, claro.

Para a maior parte dos homens, a parentalidade representa um admirável e muito exigente mundo novo. 

Não estou a referir-me apenas à exigência dos cuidados que um bebé requer. Na verdade, refiro-me sobretudo à dificuldade em conciliar essas responsabilidades com todas as outras que já existiam (e continuam a existir) e ao impacto emocional associado à diminuição significativa do tempo para o descanso ativo, isto é, para todas as atividades que nos permitem recuperar energia e descontrair, e para o namoro.

É difícil manter o erotismo e a individualidade depois da chegada de um filho. Dir-me-ão “Mas também é difícil para as mulheres”. E é verdade. Mas a maior parte das mulheres transitam mais confortavelmente para o papel parental canalizando as suas necessidades afetivas para o bebé e reivindicando sobretudo dos seus parceiros a intimidade emocional que lhes oferece segurança. Para a maior parte dos homens essa segurança emocional também depende muito da intimidade física que, por razões óbvias, tantas vezes se perde nos primeiros tempos.

A comunicação é, evidentemente, um pilar fundamental das relações saudáveis e é ainda mais essencial na transição para uma família a três. 

É através do diálogo, da transparência e da gentileza que o casal vai poder comunicar sentimentos, necessidades, expectativas e intenções. É através da vulnerabilidade sem hipercrítica que vão poder lembrar-se daquilo que os uniu e projetar o futuro.

Claro que é muito mais difícil comunicar de forma calma, honesta e conciliadora quando há noites mal dormidas, muitas mudanças para integrar na rotina, novas preocupações e muito menos tempo para relaxar sem interrupções. Partilho por isso algumas ferramentas práticas que podem ser úteis:

  • Mostrar interesse pelo outro: Ouço muitas mulheres queixarem-se da falta que lhes faz ouvirem o companheiro colocar perguntas como: “Como é que te sentes?”; “Como foi o teu dia?”; “Precisas de alguma coisa?”. Não é por mal, evidentemente, mas quando elas o fazem de forma muito intencional e não há reciprocidade, seja por cansaço, desatenção ou outro motivo qualquer, o sentimento de desamparo instala-se (e a tensão conjugal também). Se os membros do casal dedicarem algum tempo diário ou semanalmente para partilhar sentimentos, vão fortalecer o seu vínculo;
  • Diário da gratidão conjugal: É muito frequente ouvir em consulta coisas como “Ele é um ótimo pai, mas…” e depois vêm as queixas (legítimas) em relação à sobrecarga, ao cansaço ou à falta de atenção. Escrever diariamente algo pelo qual cada um se sente grato em relação ao parceiro (seja em relação ao papel parental, seja em relação a outros gestos) ajuda a manter o foco nas qualidades positivas da outra pessoa e em tudo o que a relação acrescenta em termos de bem-estar, mesmo nos momentos de tensão. Também potencia que ambos se sintam reconhecidos e não apenas criticados;
  • Ler sobre parentalidade: É mais frequente que as mulheres pesquisem muito sobre parentalidade e que assumam de forma mais firme as suas crenças e expectativas em relação à educação das crianças. Se o companheiro não fizer a sua própria reflexão baseado em tudo o que a ciência nos oferece, há maior risco de haver conflitos e maior dificuldade em conciliar expectativas e abordagens;
  • Tempo para o casal: Não há volta a dar, uma relação amorosa precisa de tempo a dois. Tempo para namorar, tempo para relaxar, tempo para conversar. Dito assim parece óbvio, mas todos os pais e mães de crianças pequenas sabem que, na maioria das vezes, não há sequer tempo para que cada um possa manter os hobbies individuais que costumavam funcionar como balões de oxigénio, quanto mais tempo para programas a dois. A questão é que é preciso um ajuste de expectativas e alguma criatividade para que o tempo seja gerido de forma equilibrada. Não chega estarem os dois na cama à mesma hora, não chega sentarem-se no sofá no final de um dia intenso para ver um episódio de uma série (e um ou os dois adormecerem ao fim de poucos minutos). É preferível combinar um almoço num sítio bonito e ambos estarem com energia e atenção para conseguirem conectar-se. É importante aproveitar o (pouco) tempo livre para fazer algo de que ambos gostem e que até aqui lhes permitia divertirem-se juntos. Estes momentos são preciosos para manter a ligação viva;
  • Mostrar apreço e reconhecimento: A transição para a paternidade pode ser repleta de inseguranças. De uma maneira geral, por detrás de um pai que não acerta à primeira (ou que não faz as coisas como a mãe/companheira gostaria que ele fizesse), está um homem que precisa que o seu esforço seja reconhecido. Ninguém deseja que haja condescendência ou bajulação. De resto, é frequente que nesta etapa da vida as mulheres assumam um conjunto de responsabilidades que são de ambos, acabando por se sentirem sobrecarregadas, sobretudo mentalmente. Mas é preciso que cada um se sinta visto, compreendido, incentivado. As críticas são frustrantes, mas são muito melhor encaradas quando percebemos que a outra pessoa não vê apenas os nossos erros e também aprecia o nosso esforço. 

4 regras para pais

O nascimento de um filho é, acima de tudo, uma oportunidade única para que o casal se sinta ainda mais conectado. Quando as mudanças, os medos, as incertezas e o cansaço são geridos com uma boa comunicação, os desafios transformam-se em alicerces e a relação torna-se mais forte. Tudo pode estar um caos, mas, se os membros do casal assegurarem que a sua comunicação é feita com gentileza, curiosidade, paciência e manifestação clara das necessidades, tudo fluirá. O “segredo” está em olhar para os momentos difíceis e questionar: “Estou a garantir que a minha comunicação traduza estas quatro regras?”. Experimente!

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