No século XIX os portugueses referiam-se uns aos outros por “vossa excelência”. No século XX os jovens escrevem “vc”, seguido de “kkkk” e carinhas (emojis). Provavelmente os nossos netos já só vão escrever “v”. Com isto quero dizer que a evolução dos tempos existe obviamente, e ainda bem. Mas, isso não quer dizer que o mundo agora é melhor ou pior do que antigamente, apenas é diferente.
Os jovens de hoje em dia
São os jovens de hoje em dia menos inteligentes do que nós éramos? Não! São até capazes de ter uma percepção muito mais rápida das coisas do que nós tínhamos.
A noção de amizade, sim, é diferente. Hoje têm cinco mil amigos. Nos anos 90 tínhamos os amigos da rua da escola e pouco mais.
O tempo livre era passado na rua, a subir às árvores, a andar de bicicleta, a tocar campainhas e fugir, ao telefone a pregar partidas com coisas tão simples como: “Estou a ligar para o Sr. Coelho? É para avisar que já tenho aqui as cenouras”, até termos o cadeado no telefone! Agora o tempo livre é passado na Internet, com amigos virtuais.
Os nossos pais chateavam-se e mandavam-nos para casa. Hoje nós mandamo-los para a rua.
Os quartos estavam repletos de posters nas paredes, de coleções de latas, a música era ouvida nos walkman, e quando as cassetes encravavam pegávamos na caneta e desenrolávamos. Os tamagotchi, os tetris, os elásticos, as bolas eram os nossos jogos mais evoluídos. Hoje têm os seus ídolos à distância de um clique
Tínhamos de estar a “gramar” com os anúncios sem adormecer para ver o fim de um filme. Agora puxam para a frente e já está. Passávamos horas a ver “Fame”, outras séries e telenovelas. Eles veem Netflix.
Estávamos sempre feridos das quedas de bicicleta, desbotávamos jeans com lixívia. Hoje compram em qualquer loja calças com buracos e/ou desbotadas.
Para estudar, escrevíamos folhas e folhas até termos calos no dedos. As cábulas eram metros de papelinhos enrolados nas canetas BIC. Hoje está tudo no telemóvel.
Íamos à biblioteca quando precisávamos de investigar sobre um assunto. Hoje o Dr. Google explica tudo.
O diário era secreto e escondíamos do mundo inteiro. Hoje o giro é expor o nosso dia a dia nas redes sociais.
Os conflitos aconteciam na rua. Hoje são nas redes sociais.
Antigamente pedíamos em namoro com papéis voadores, com uma cruz, com “Sim” e “Não”. Hoje os pedidos são feitos no Instagram ou no Whatsapp.
Como não tínhamos telefone, ninguém controlava onde estávamos e a fazer o quê. Hoje os telefones dos nossos filhos dão-nos a localização precisa de onde estão.
O que permanece igual?
As drogas, as tatuagens, o umbigo à mostra, as calças rasgadas, as discussões entre irmãos, a preguiça de não querer fazer nada, a apatia, a oscilação entre tristeza e alegria, isso é igual.
Então, agora que nos recordamos da nossa adolescência, continua a achar que os jovens de hoje em dia são muito diferentes?
A adolescência é uma fase de grandes transformações, onde os jovens não se reconhecem – os braços são grande demais, desengonçados, os pêlos aparecem, a voz modifica-se… É o chamado “monstro do espelho”. Já não são crianças, não são ainda adultos e não se reconhecem. Não sabem quem são, andam à procura de uma nova identidade.
Em busca de uma nova identidade.
Há mudanças a nível cerebral, a produção de dopamina diminui drasticamente, o pensamento é muito mais rápido, daí anteciparem cenários e desenvolverem a ansiedade. Precisam de constantes desafios para sentirem que a vida é boa e prazerosa. Não percebem se o olhar dos outros é bom ou mau, daí terem muitas vezes baixa auto-estima. Precisam de ação, de testar limites e dificuldades para se manterem motivados. Acham que conseguem fazer tudo e que os pais não sabem nada! Os pais deixam de ser ídolos, passando a ser os pares a sua identificação.
Esta é uma fase em que os pais precisam de estar muito atentos e presentes, mas habitualmente o que acontece é precisamente o contrário, como os pais não os compreendem, afastam-se. Mas o problema é que nem eles, adolescentes, se compreendem. Somos nós, adultos, que devemos ajudá-los.
Não é preciso ser “amigão”, mas, sim, “amigo”.
O “amigão” não se importa com as consequências. Não alerta, nem transmite segurança. O amigo está lá, mas põe limites. Brinca, mas fica sério quando precisa. Alerta para perigos. Eles estão a criar uma imagem de si próprios e vão identificar-se com quem estiver perto.
A autoimagem é formada pelos pares.
Se o seu grupo o aceita, valoriza, valida, motiva, então ele vai sentir-se capaz de fazer muitas coisas e tem uma boa auto-estima. Se o grupo o deprecia, diminui, faz Bullying, isso vai influenciar na sua auto imagem, vai ferir a sua identidade e auto-estima. O perigo é quando são valorizados por fazerem disparates e só coisas erradas.
Então, pais, estejam por perto. Supervisão e não superproteção! Tragam os amigos para casa, observem a dinâmica do grupo, sejam flexíveis, com tempo de qualidade, não é preciso muito tempo, mas, sim, tempo de entrega e qualidade.
Vai continuar a dizer que esta é a geração rasca? Ou vai ajudá-los a encontrarem-se num mundo melhor, a serem adultos seguros, que sabem lidar com frustração?
Sim, precisam de atenção, mas não de superproteção. Precisam de limites, de aprender a crescer seguros, para saberem lidar com os desafios. Têm de ter riscos moderados para serem adultos que se relacionam bem na sociedade. Saberem viver bem, com riscos controlados, e principalmente sem se magoarem, nem magoarem ninguém.
Substitua o castigo pelo incentivo, a crítica pelo elogio, os sermões por escutar a sua opinião, observe sem interferir e tudo vai dar certo.
Vamos ajudar os nossos adolescentes a serem ainda melhores do que nós. Sem comparações, nem acusações, mas, sim, com grupos saudáveis.