Não fomos feitos para viver sozinhos. E, os amigos fazem parte das várias fases da nossa vida e das nossas histórias de vida. Na infância, na adolescência, na vida adulta, na escola, na faculdade, na rua, no trabalho. Todos precisamos de amigos. Eles são essenciais. São importantes para o bem-estar, para a qualidade de vida, para a saúde física e para a saúde mental. Dão-nos uma sensação real de felicidade nos momentos em que estamos juntos. A amizade é por excelência um espaço de socialização, intimidade e sintonia em que se pode e deve relaxar. Estar com amigos baixa a ansiedade e minimiza a possibilidade do aparecimento de aspectos depressivos. ‘Bora lá estar com amigos!
Mas, afinal, o que têm os amigos de tão especial?
Os amigos são aqueles com quem nos entendemos bem hoje e com quem temos afinidades e interesses em comum. Permitem criar vínculos afectivos. São cuidadores: cuidam de nós. Ajudam nas situações de aflição. Motivam-nos quando estamos abatidos. Convivem e riem connosco. Abraçam-nos quando caímos. Alegram-se com a nossa alegria e choram com a nossa tristeza. Mas, também nos puxam as orelhas quando o devem fazer.
Um amigo é muito mais do que um conhecido, é muito mais do que um contacto ou que uma simples presença virtual. É aquela pessoa que parecemos conhecer desde sempre e a quem o silêncio não incomoda quando o assunto acaba. E, o silêncio diz tanta coisa… Os laços criam-se e constroem-se e a amizade solidifica-se no interagir, porque ouvimos e somos ouvidos; afinal o ser Humano tem o poder da linguagem. As memórias que daqui advém são significativas assim como o é o impacto que têm no desenvolvimento saudável da pessoa e no caminho próprio e único para a maturidade.
Porque é que os amigos são importantes na vida das pessoas?
Os amigos são pessoas que admiramos, mas são sobretudo a oportunidade de desenvolvimento afectivo que existe dentro da relação interpessoal com eles. É dentro desta relação com pares que num determinado momento do desenvolvimento das estruturas da personalidade se operam todas as transformações que permitem a construção do aparelho psíquico dentro de uma dada cultura, naturalmente.
Então, a relação com os amigos contribui de forma marcada para a estruturação e reestruturação cerebral que acontece na relação com os outros, onde o “agir” faz surgir novas redes neuronais que permitem e determinam o desenvolvimento das estruturas de personalidade da pessoa e da construção da sua individualidade. Este processo implica a elaboração de funcionamentos nervosos superiores que vão permitir adoptar novos comportamentos e tornar-se um ser Humano único, com uma organização cerebral única, onde as aprendizagens vão ditar de que forma o desenvolvimento cerebral acontece. Assim se desenvolve a percepção, a resolução de problemas, as funções executivas, a memória e a consciência criando sentidos próprios para a identidade da pessoa.
A relação com os amigos também é importante no sentido de que permite tomar consciência que o outro também é uma pessoa com vontades e desejos próprios e que não são necessariamente iguais aos seus. Que o outro não é apenas um outro físico, mas também é um outro psicológico. Permitem experimentar o facto dos outros colocarem limites também. Tudo isto leva a uma aquisição de consciência do outro e de si próprio na vida e no mundo. Por isso, a relação de amizade é um espaço de “ensaio” para perceber o mundo como os outros também o percebem e onde as perdas e reencontros acontecem muitas vezes. Reavaliam-se opiniões, comportamentos. Aprende-se e apreende-se. Treina-se a desilusão e a frustração. Todos eles movimentos e contributos fundamentais no desenvolvimento mental das pessoas e na construção da sua identidade.
Como reconhecer uma amizade verdadeira?
O ser Humano é rico em histórias de vida e carências e uma relação de amizade verdadeira implica ter a percepção do outro por inteiro; um outro que é pessoa e que também tem um coração a bater no peito. Como tal, a relação de amizade profunda tem que ser um encontro em que a alegria prevalece. Em que cada um fortalece, faz crescer e desenvolver o outro contribuindo para o bem-estar de ambos. Um ajuda o outro a percorrer um caminho sempre no âmbito da partilha.
A amizade implica descentramento: a pessoa conseguir descentrar-se de si própria e estar emocionalmente disponível para o outro tendo a expectativa válida de que este outro faça o mesmo consigo. Claro que tal obriga muitas vezes a deixar de lado a sua zona de conforto o que significa que a pessoa se expõe mais e que se submete ao olhar crítico do outro. Mas, quando estamos numa amizade que é realmente uma amizade, o que o outro diz, que é na maior parte das vezes dito com o objectivo de ajudar e/ou esclarecer, dí-lo afectuosamente, com afecto, com carinho, com cuidado. Pode dizer algo profundo que vai ter um impacto sério ou que pode até mesmo provocar alguma confusão mental e contrariedade, mas diz isto como quem quer realmente ajudar. E, quem recebe, recebe como a palavra, o interesse e a acção do amigo como uma ajuda válida e importante.
Embora seja difícil definir especificamente a amizade porque ela envolve uma grande cumplicidade entre as pessoas, é uma das relações mais “maduras” que existe. Aqui não há distâncias, não há cobranças, não há características típicas dos amores e da infância. Há, sim, um prazer enorme na companhia do outro e intenções positivas. Ou seja, é uma relação repleta de afectividade intensa fundamentada nas afinidades, nos interesses, nas escolhas, nos gostos e na confiança onde as pessoas sentem um “aconchego afectivo” sem dependência e com respeito pelas diferenças. É querer o bem um do outro acima de qualquer “jogo de cintura”. Por tudo isto, o importante não é a quantidade de amigos que se tem, mas a qualidade das relações de amizade reais e significativas que tem na sua vida.