Como deve calcular, é perfeitamente natural e espectável que com o avançar da idade o nosso corpo vá sofrendo algum desgaste e que o seu regular funcionamento se veja afectado. É um facto da vida. E para o qual devemos estar preparados. Ora o cérebro sendo um órgão, ainda que especial, não deixa de estar sujeito a esta condição e, por isso, também ele passível de sofrer de envelhecimento. Todavia, no caso do cérebro há formas de conseguir prevenir os efeitos deste mecanismo de envelhecimento.
É verdade. É possível criar condições para que os efeitos sejam menorizados e inclusive obter melhorias notáveis de desempenho cerebral, mesmo em pessoas de idade mais avançada. Agora, há que perceber que isto não acontece ocasionalmente; não é uma questão genética ou de sorte, que pode acontecer a uns poucos privilegiados e os outros, infelizes, têm de se contentar com o seu destino. Não! Não é nada disso!
Para ter um cérebro activo, mesmo em idades avançadas, há que investir em actividades que promovam a saúde e o desenvolvimento neuronal do cérebro.
Aqui, comparando novamente o cérebro aos outros órgãos, podemos acrescentar que em certa medida ele é especial: tem uma reserva de novos neurónios (que nascem a períodos) que podem ser usados para reforçar algumas das funções cerebrais (neurogénese) e tem a capacidade – quando devidamente estimulado – de alterar as redes neuronais que determinam o seu funcionamento (neuroplasticidade).
Então, temos uma reserva de novos neurónios que podem ser utilizados para reforçar as nossas funções cerebrais e também mecanismos de aceleração, que no caso do cérebro correspondem a melhoria das competências cerebrais (memória, capacidade de concentração, agilidade mental, etc.). Porém, para que estes benefícios se façam sentir no cérebro de cada um de nós, tem de haver uma “ordem” nossa. Este fenómeno só acontece se adoptarmos determinado tipo de actividades e estilo de vida; se tivermos uma vida pouco activa intelectualmente e pouco saudável estes benefícios serão reduzidos, ou mesmo nulos.
Cada um de nós pode tirar partido desta forma de trabalhar do cérebro, mas para isso temos de querer e agir nesse sentido.
5 Dicas para prevenir o envelhecimento não saudável do cérebro:
Deixo aqui algumas indicações de atitudes e comportamentos que irão ajudar a prevenir o envelhecimento não saudável do cérebro. Se fizer tudo que está a seu alcance, poderá mesmo obter melhorias notórias no seu desempenho cognitivo:
1 – Fazer exercícios para o cérebro
A primeira coisa que aconselho a fazer é exercício para o cérebro. Fazer exercício específico para o cérebro e criar o hábito de o fazer com regularidade. Do mesmo modo que fazer exercício físico regular nos garante uma boa forma física, o exercício cerebral leva-nos a obter uma boa forma cerebral. E esta boa forma cerebral garante-nos bons desempenhos cognitivos no dia-a-dia, tanto no plano profissional, como no âmbito da nossa vida pessoal. Como medida preventiva, sabemos hoje que atrasa e menoriza os impactos de doenças demenciais, como o Alzheimer. Assim, esperam-se, entre outras tantas, melhorias ao nível da capacidade de memória, de concentração, de agilidade mental, nas competências da linguagem e raciocínio lógico.
É importante que esta actividade seja regular e não apenas algo que se faz muito esporadicamente. É fácil perceber que da prática ocasional não se podem esperar grandes resultados. O mesmo acontece com o exercício físico: prática esporádica não leva ninguém a atingir uma boa forma. Mantenha sempre esta ideia do exercício físico em mente, porque o que se passa com o exercício cerebral não é muito diferente.
O que é exercício cerebral?
O exercício cerebral são actividades que “obrigam” as células do cérebro (neurónios) a executar as acções que vão reforçar as funções cerebrais que queremos desenvolver mais. Por exemplo, se queremos estimular a nossa função da concentração temos de fazer actividades que nos obrigam a estar muito concentrados. Mas, se por outro lado, queremos ter uma melhor capacidade de memória, temos de nos embrenhar em actividades que nos forcem a memorização. Para lhe facilitar a vida nesta actividade tão importante para o seu cérebro, criei planos de exercícios estruturados e pensados especificamente para este efeito, que foram publicados em livros (Exercite o Seu Cérebro; 150 Exercícios para um Cérebro Activo; Exercícios para Recarregar o Cérebro). Assim, basta-lhe pegar nestes livros e seguir o plano diário de exercícios feitos para obter resultados com maior rapidez. Quero salientar que não se trata de um qualquer livro genérico de passatempos, mas antes de livros especializados para o efeito.
2 – Alimentação apropriada para o cérebro
Toda a alimentação que ingerimos afecta-nos para o bem e para o mal. Nem tudo o que comemos é necessário ao bom funcionamento do corpo. E muito do que comemos faz-nos mal. Deixo aqui algumas sugestões para uma alimentação que cuida especialmente do seu cérebro. Alimentos que nos ajudam a activar a atenção, concentração, memória e outros que ajudam a combater os processos inflamatórios comuns no nosso organismo: Abacate, aipo, alecrim, azeite extra virgem, beterraba, brócolos, caldo de osso, chocolate negro, curcuma, frutos secos, gema de ovo, groselha, hortaliças, mirtilo, óleo de coco, salmão, sardinha, sálvia, sementes de abóbora, tomate.
3 – Dormir bem
De todos os estudos que se têm debruçado sobre o sono podemos extrair uma grande conclusão: a grande maioria dos autores estima que o número ideal de horas que o nosso corpo e cérebro precisam esteja entre as 7 e 8 horas. Há inclusive autores que encontraram evidências de um acréscimo de risco de morte prematura entre as pessoas que dormem menos de 6 horas diárias.
Estas horas ideais de sono às quais deveríamos entregar o nosso corpo são um elemento-chave para manter o cérebro em boa forma. Esta magnífica “máquina” precisa de se desligar a períodos regulares, o que lhe permite repousar da actividade que exerce durante as horas de vigília, pois a actividade exagerada pode levar à exaustão. Outra ideia que é defendida desde os primórdios da ciência psicologia, principalmente por Freud, refere-se ao papel reorganizador do sono sobre as experiências e acumular de informação, muitas vezes caótica, que ocorre durante o dia. O sono e os sonhos encarregar-se-iam de organizar este material. Sem sono apenas acumulariamos pressão e possivelmente respostas agressivas face ao real.
Estudos recentes têm demonstrado que durante o sono, uns “pequenos trabalhadores” chamados células da glia (que existem no cérebro além dos neurónios) exercem a uma função de limpeza de “material tóxico” prejudicial ao cérebro, incluindo o tipo de proteínas que se desenvolve nas pessoas com demência. Também se verificou que nesta fase se estabeleciam novas conexões entre neurónios que consolidavam os conhecimentos adquiridos durante o dia. A este propósito gostaria de acrescentar que há uma posição que facilita este processo de limpeza do cérebro enquanto dorme: deitado de lado, em posição fetal.
Resumindo, durma pelo menos 7 horas por noite e se o fizer na posição fetal obterá maiores benefícios para o seu cérebro.
4 – Exercício físico
A actividade física desempenha também um importante papel no capítulo da saúde cerebral. Não só proporciona uma boa condição esquelético-muscular e cardio-respiratória, como também pode ajudar a melhorar a condição cognitiva, quando explorado em favor desta. Vamos a factos, sabe-se que a actividade física promove a formação de uma proteína que dá pelo nome de BDNF e que actua sobre certos neurónios ajudando na sua sobrevivência e que é um factor de desenvolvimento de novos neurónios e novas conexões entre neurónios (o substracto para o desenvolvimento cognitivo). A boa notícia é que a BDNF é mais activa em neurónios ligados à aprendizagem, memória e funções executivas (planeamento, execução, regulação e verificação). E para que este efeito aconteça, não é necessário fazer exercício pesado, nem passar longas horas de ginásio. Basta, que se mantenha o hábito de fazer pequenas caminhadas de 30 a 60 minutos. Segundo alguns estudos, com dados de saúde de indivíduos obtidos durante 35 anos, demostraram que a actividade física (entre outros factores) era um dos elementos-chave que contribuiam para a redução em 60% no risco de desenvolver uma demência. Podemos, assim, com toda a propriedade afirmar que a falta de exercício físico corresponde a menos neurónios e menos conexões entre neurónios.
5 – Conviver, evitar o isolamento social
Conviver e estabelecer relacionamento com os nossos semelhantes sempre foi uma das actividades preferidas dos seres humanos. Este tipo de interacção não só proporciona sensações prazerosas (quando as interacções são positivas) como promove a actividade cerebral.
O prazer proporcionado pelo contacto social promove um incremento de certas substâncias químicas no cérebro. Essas substâncias, por sua vez, induzem ao bem-estar e reforço da aquisição e memorização de informação. Pelo que podemos dizer que a informação que é veiculada em contexto social de convívio é melhor retida pelo cérebro. Outra das vantagens é a de termos melhor capacidade de ouvir, aceitar opiniões e pontos de vista diferentes dos nossos: quando queremos promover uma boa interacção com os demais, estamos mais dispostos a não sermos tão rígidos quanto às nossas posições e isso leva-nos a ouvir o que os outros têm a dizer. Mesmo nem sempre partilhado dessas opiniões vamos ouvi-las e não raras vezes damos por nós a pensar nelas e até a admitir que possam ter alguma validade. E é este o mecanismo que nos permite adquirir novas informações e pontos de vista. No fundo a contribuir para a actividade cerebral.
Por outro lado, o isolamento não provoca grande actividade cerebral. Em estudos recentes verificou-se que o isolamento social provoca alterações na estrutura cerebral, com perdas cognitivas. Estas perdas fazem sentir-se com maior impacto nas pessoas idosas, levando ao aumento de risco de demência. Não conviver não só não ajuda a desenvolver e aprimorar as nossas capacidades cerebrais, como ainda tem um efeito de levar à perda do que já eram as nossas capacidades habituais. As redes cerebrais de convívio, por um lado, e de aprendizagem e memória, por outro, são muito próximas e partilham actividade. Daí haver esta ligação entre a actividade social e a actividade global do cérebro.