Como gerir idades diferentes numa relação?

Cláudia Morais // Setembro 16, 2022
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Uma relação em que haja uma grande diferença de idades inclui mais desafios, mais riscos, pelo que também requer cuidados redobrados. De que formas é possível proteger a relação e aumentar a probabilidade de dar certo? 

Nos tempos que correm toda a gente sabe que as estatísticas são assustadoras para quem ambiciona uma relação de compromisso feliz e duradoura. Por cada 100 casamentos há 70 divórcios, independentemente do fator idade. Vários estudos mostram que ao longo do tempo, a satisfação conjugal dos casais em que haja uma grande diferença de idades diminui mais do que a dos casais com idades próximas, aumentando a probabilidade de se divorciarem

Mas o que é, afinal, uma diferença de idades significativa? 

Alguns estudos mostram que, nas relações heterossexuais, os desafios são maiores quando o homem é mais velho do que a mulher 15 ou mais anos e quando a mulher é mais velha 7 a 10 anos, mas outros concordam que uma diferença de 10 ou mais anos entre os membros do casal já pode representar desafios extra. 

Então, que desafios são esses e o que é que estas pessoas podem fazer para imunizar a sua relação?  

1. Lidar com a pressão social. 

As mulheres que optam por namorar com homens mais novos parecem enfrentar mais julgamentos. No entanto, esta tendência pode ter decrescido com o aparecimento do movimento #MeToo, que veio destacar a exploração e o abuso de poder associado a alguns relacionamentos em que o homem era mais velho e mais poderoso.

Independentemente destes estudos, é sabido que vivemos numa sociedade julgadora e capaz de inundar qualquer pessoa de comentários de ódio. É verdade que as figuras públicas estão muito mais expostas a estes comportamentos, mas, por outro lado, também somos mais tolerantes com as escolhas dos artistas e celebridades e mais exigentes com as pessoas que nos são próximas. Claro que esta exigência traduz preocupação e interesse, mas não deixa de haver julgamento e, consequentemente, sofrimento.  

Um casal com uma diferença de idades significativas pode contar com uma boa dose de perguntas extra e é importante que esteja preparado para isso. Saber lidar com essa pressão implica aceitar a curiosidade dos outros e definir limites claros em relação a essa interferência. Por exemplo, é natural que um pai ou uma mãe expresse a sua preocupação em relação aos desafios e ao futuro da relação e isso não tem de ser visto como um ataque ou uma forma de desrespeito. Mas também é natural que o outro membro do casal se sinta desgastado e desrespeitado se houver comentários negativos ou perguntas recorrentes sobre o assunto, pelo que é desejável que cada um imponha limites claros aos próprios familiares e, assim, a relação saia protegida. Por exemplo, um filho pode dizer: “Mãe, eu compreendo a tua preocupação, mas quando questionas de forma repetida se eu não tenho medo do futuro, eu sinto-me triste e desrespeitado. Preciso que pares de o fazer e que respeites as minhas escolhas”

Na prática esta regra é válida para qualquer relação. Quando alguém da nossa rede de suporte faz escolhas que magoem o nosso parceiro e/ou que perturbem o bem-estar da relação, é importante que seja o membro do casal que tem uma relação familiar ou de maior proximidade afetiva com essa pessoa que intervenha. Mas para que consigamos ter a coragem de ser o porta-voz da relação, precisamos de estar em sintonia e isso envolve comunicar de forma clara sobre aquilo que sentimos, valorizar as queixas do nosso parceiro e assumir que as soluções de compromisso vão depender da capacidade de cedência de ambos. 

2. Gerir as expectativas. 

Não há volta a dar: nós partimos sempre para uma relação com um guião predefinido, independentemente da diferença de idades. Quanto mais apaixonados estivermos, mais tendemos a ignorar as diferenças que nos separam da outra pessoa, incluindo os seus planos e expectativas. Por exemplo, quantas vezes uma pessoa que queira ter filhos ignora o facto de o companheiro dizer que não quer, na expectativa de que as coisas mudem ao longo do tempo? Quando há uma grande diferença de idades é mais provável que haja esta e outras discrepâncias, pelo que, como sempre, a comunicação é fundamental

É importante que os membros do casal se habituem desde cedo a fazer perguntas que traduzam a sua genuína curiosidade e, por outro lado, que tragam uma honestidade incondicional em relação aos seus próprios objetivos. Isto evitará muito sofrimento. 

Há áreas específicas que podem ser alvo de atenção: 

  • Filhos;
  • Saídas (sobretudo à noite);
  • Balanço entre o tempo livre e o tempo dedicado ao trabalho.

3. Lidar com o dinheiro. 

A nossa relação com o dinheiro está habitualmente ligada à fase do ciclo de vida em que estamos. Se, por um lado, é provável que as pessoas mais velhas se sintam mais seguras do ponto de vista financeiro – porque alcançaram a estabilidade profissional mais cedo -, por outro, também podem estar menos dispostas a correr riscos que consideram desnecessários e/ou que coloquem os filhos numa posição mais vulnerável. Ter uma relação de compromisso implica conseguir falar abertamente sobre dinheiro e, sobretudo, sobre os objetivos e as necessidades que o dinheiro pode permitir atender.  

Diversos estudos mostram a importância da partilha de valores morais entre os membros do casal (independentemente da diferença de idades). No caso destes casais, até podem existir valores idênticos, mas a fase do ciclo de vida de cada um pode determinar a existência de necessidades ou vontades diferentes. Por exemplo, se a pessoa mais velha da relação tiver casa própria e estiver disponível para viver a dois, pode sentir dificuldade em aceitar que a outra queira investir numa habitação própria, com todos os constrangimentos que daí decorrem. Porque quando contraímos um empréstimo para a casa ficamos mais limitados para fazer os gastos que quem tem a casa paga pode fazer e, sobretudo, porque se a comunicação não for clara, este passo pode ser interpretado como uma demonstração de falta de confiança (no parceiro e/ou na relação). 

4. Gerir a maturidade emocional. 

A maturidade emocional não depende apenas da idade cronológica. Todos conhecemos pessoas jovens com muita maturidade e pessoas mais velhas que parece que não amadureceram, mas a passagem do tempo acarreta quase sempre vivências que contribuem para o nosso amadurecimento. Nas relações em que haja uma diferença de idades significativa, a pessoa mais velha pode dar por si a assumir uma sobrecarga emocional, levando à exaustão e, portanto, aumentando a probabilidade de ocorrer uma separação. 

Se, por um lado, não se pode forçar ninguém a dar aquilo que não tem, por outro, é importante que cada membro do casal possa assumir uma postura de abertura e curiosidade em relação às necessidades do outro. Na prática, já todos experimentámos a sensação de impotência quando queremos ajudar um amigo que esteja a passar por uma situação difícil pela qual nunca passámos. O facto de não termos experiência na matéria não nos impede de mostrar o nosso interesse, a nossa solidariedade e a vontade de fazer parte da solução. Isso também é válido no amor. Precisamos invariavelmente da certeza de que a pessoa que está ao nosso lado se importa connosco, com os nossos sentimentos, mesmo que nem sempre os compreenda. É por isso que o diálogo e o altruísmo são tão importantes numa relação

Outra forma de colmatar o desafio associado às diferenças na maturidade emocional é a criação de uma rede de suporte sólida. Os amigos são invariavelmente a nossa fonte de apoio. Quando nos apaixonamos por alguém, aproximamo-nos gradualmente da sua rede de amigos e, se investirmos na medida certa, os amigos da pessoa que amamos acabam por tornar-se nossos amigos também. Estes laços podem ser cruciais para nos ajudar a perceber ainda melhor as necessidades afetivas da pessoa que está ao nosso lado, em particular nas relações em que haja uma grande diferença de idades. Afinal, os amigos do nosso parceiro conhecem-no como ninguém e podem ajudar-nos a entendê-lo melhor. 

5. Olhar para o futuro. 

Por um lado, à medida que a relação vai evoluindo, a diferença de idades pode fazer-se notar cada vez menos. Afinal, uma coisa é um dos membros do casal ter 35 anos e o outro 20 e outra coisa é um ter 55 e o outro 40. Quando ambos têm maturidade emocional (que, como vimos, também advém da experiência), as coisas ficam mais fáceis. Mas, por outro lado, o envelhecimento traz outros desafios: a energia diminui, as prioridades mudam e as necessidades também. A pessoa com mais idade pode começar a pensar na velhice, nos cuidados que a sua saúde possa requerer e no papel que o outro estará na disposição de assumir. É legítimo que haja dúvidas e insegurança – dos dois lados – e é importante que os assuntos sejam abordados de forma clara e honesta

Algumas pessoas dão o seu melhor para fugir aos assuntos sensíveis – seja para evitar que a relação se torne demasiado dramática, seja pelo medo de afugentar o parceiro. De uma forma ou de outra, o evitamento tende a trazer ainda mais problemas, já que cria sentimentos de solidão, desconfiança e desamparo, pelo que os membros do casal vão precisar de assumir uma postura de aceitação das próprias vulnerabilidades para conseguirem sentir-se unidos e esperançados em relação ao futuro

Claro que todas as relações se transformam ao longo do tempo e qualquer casal pode dar por si a enfrentar dificuldades para as quais não está preparado. Quantas vezes um jovem casal enfrenta dificuldades no relacionamento depois do – planeado e desejado – nascimento do primeiro filho? Quantos casais lidam com uma crise no casamento na sequência de uma situação de desemprego ou depois da saída dos filhos de casa? 

Há muitos fatores que podem contribuir para a desconexão conjugal e duas pessoas podem dar por si a crescer em sentidos opostos, independentemente da diferença de idades. Se um casal continuar a amar-se e estiver a enfrentar desafios que pareçam inultrapassáveis, é importante considerar a ajuda externa. A terapia de casal pode ajudá-los a explorar novos caminhos, conciliar sentimentos e necessidades e devolver a alegria e o entusiasmo à relação.

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