Às vezes nem sabemos porque odiamos o nosso corpo, as nossas formas, estrias, o nosso cabelo, a nossa pele. Somente odiamos e ponto. Não refletimos sobre isso. Vivemos numa ditadura do corpo perfeito, do corpo “ideal”. Mas afinal, o que é corpo ideal? O que é padrão de beleza?
Desde muito cedo, somos ensinadas a odiar os nossos corpos e a desejar constantemente mudá-los. Integramos desde muito cedo crenças, como, por exemplo: “não ser magra é feio”; “ter celulite é feio”; “ter estrias é feio”, e crescemos a querer mudar tudo isto. São valores tão impregnados nas nossas mentes, que se tornam enraizados.
Se pararmos para pensar, as palavras “padrão” e “ideal” descartam as particularidades de cada ser humano, certo?
“Robotizamos” de tal forma o ser humano, desejando sermos iguais uns aos outros – com as mesmas formas, a mesma cor de pele, o mesmo cabelo – que ignoramos toda a nossa individualidade! E isto leva-nos a outra questão:
Se fossemos todos iguais, o que despertaria no outro, a admiração por nós?
E como nos sentiríamos nós sendo igual à nossa amiga, à nossa colega de trabalho ou à nossa vizinha? É isso mesmo o que desejamos?
Na verdade, só odiamos o nosso corpo, porque nos ensinaram a odiar. É algo aprendido.Mas isso significa que nos devemos resignar e não mudar o que não gostamos em nós? Não! Enquanto psicóloga, encorajo muito os meus pacientes à mudança. Não aceito e nem apoio os clichés do “Aceite-se como é!” porque não há motivo para aceitar algo que não gostamos, se podemos mudar. Seja física, psicológica ou emocionalmente. Porém, existe uma diferença considerável neste processo de mudança:
Mudar por amor é diferente de mudar por ódio.
Somos ensinadas a mudar nosso corpo por ódio a ele, a acreditar que só seremos felizes e bonitas se estivermos incorporadas nestes padrões. Desejar fazer atividade física, uma dieta saudável, cuidar da nossa saúde, claro que não existe problema nenhum nisso. É, inclusive, suposto que esse autocuidado nos acompanhe a vida toda. O que for benéfico para o nosso corpo sempre será bem-vindo. O problema reside em acreditar que só seremos felizes, bonitas e desejadas se atingirmos determinados padrões. Ou acreditar que todas as mulheres precisam querer ser magras, fazer dietas, atividade física, que precisam procurar incessantemente essa “perfeição”. Nada pode ser imposto. O corpo é nosso. Somente nosso.
Não é sobre aceitar o nosso corpo, é sobre amá-lo!
A questão da aceitação do próprio corpo comete, grande parte das vezes, um erro crasso – confundir aceitação com amor. Ignoramos muitas etapas quando igualamos esses sentimentos. Aceitar é um passo. Amar é resultado de muitos desses passos. E, a primeira verdade que deve ser dita é a de que o amor nem sempre acontece…
Às vezes, tudo o que ocorre, e é necessário, é apenas uma atitude neutra sobre determinados aspetos físicos. Ou seja, eles apenas deixarem de nos incomodar tanto. Deixarem de ser os principais “barómetros” da nossa autoestima. Nesse momento, eles perdem o poder de limitar as nossas escolhas, a nossa liberdade e o nosso bem-estar. É como fazer uma trégua com eles, retirando-lhes o protagonismo quando nos olhamos ao espelho. Contudo, “aceitar” não é amar e menos ainda resignar-se!
O importante é distinguir aceitação do corpo de amor pelo corpo.
Vamos, então, a outra grande verdade: A ideia de admirar cada parte sua não é realista. E, se colocarmos isso como uma obrigação, estaremos apenas a substituir uma relação complicada por uma relação idealizada. Se aplicarmos isto em termos de relacionamentos, talvez fique mais claro. Por exemplo, com seus colegas de trabalho. De alguns você gosta, sente uma grande cumplicidade a ponto de apreciar a companhia destes. Com outros, não tem assim tanta afinidade, digamos assim. E, se quiser transformar cada colega “menos querido” num amigo, a possibilidade de se frustrar será imensa. Por outro lado, se você decidir priorizar o seu bem-estar no ambiente de trabalho, o caminho é bem mais simples e viável.
Quero com isto dizer-vos, que não é preciso construir um afeto profundo para mudar as coisas. Basta investir o nosso esforço numa convivência gentil. Ou seja, focar em aceitar o outro, tal como ele é. Porque simplesmente há aspetos que não podemos mudar. O mesmo se aplica às características que temos no nosso corpo e das quais não podemos mudar.
A aceitação é um processo altamente libertador.
Por isso, agora, considere esta metáfora de relacionamento ao pensar na sua auto aceitação corporal. Não lhe parece agora um objetivo mais razoável do que esperar nutrir um honesto e repentino amor pelo que nos desagrada?
Por isso, vamos aceitar o que não podemos mudar e quando for e o que for para mudar, que seja num profundo ato de amor e não de ódio.