A propósito do Dia Internacional contra a Homofobia!

Manuel Luís Goucha // Maio 17, 2019
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Sempre me soube como sou, pelo menos desde que tenho discernimento e penso pela minha própria cabeça.

Comecei cedo, logo na catequese, pondo em causa o que me diziam ser vontade de Deus, essa de sermos todos iguais. Que não, ripostava eu com ginete, somos todos diferentes e é nas diferenças que está o ganho. Sabia-me fora do que me afiançavam ser a norma e nunca vi nisso drama algum.

Começava por ser filho de pais separados, isto nos idos de sessenta, quando o divórcio não era permitido e a mulher carregava sempre com o ônus da situação e, se bem que nunca tivesse morrido de amores pelo padrasto, sempre me diverti com a ideia de ter, a bem dizer, dois “ pais” e duas “mães”. Uma fartura! Quando a vida te dá limões melhor é mesmo aprender a fazer limonada.

Atirava-me aos livros, neles esquecendo as horas, procurando outros mundos desafiadores e era no teatro das segundas-feiras na televisão e na música clássica que sentia poder ir mais além nas emoções, aquelas perante as quais as palavras se acanham.

Na missa de Domingo a que fazia questão de assistir, ao lado de uma avó beata, pouco ligando ao latim do padre então de costas para a assembleia de muitos fiéis e outros nem tanto, maravilhava-me com a talha ourada e triunfante que vestia o altar-mor e com os azulejos à nossa volta num alvoroço de santinhos e sacrifícios.

Cedo percebi que haveria de ser o Belo a mapear o meu caminho.

Nunca o silêncio haveria de ser meu carrasco que é nele que me inquieto e me encontro, num permanente desafio e assim agarro a Vida que quis para mim.

“Temos um maricas na família?”- perguntou irritadiço o meu pai, quando um dia nos foi visitar e depois da minha mãe dizer-lhe dos meus gostos. Faltou acrescentar que eram os rapazes da minha idade, colegas de liceu ou amigos da rua, que despertavam o meu, ainda pouco perceptível, desejo, mas isso só eu sabia.

Maricas era apenas uma palavra na boca de quem pouco ou nada conhecia de mim, apesar de meu progenitor.

Cedo aprendi que as palavras têm a importância que lhes quisermos dar e muitas há que se dissolvem na amargura de quem as diz. Já Felicidade é palavra cheia e cintilante, por isso quando aos dezoito ouvi da senhora minha mãe, ao confrontar-se com a minha sexualidade: “só quero que sejas feliz!”, prometi a mim próprio que por assim existir não faria conta dos juízos dos de fora, que só aquele me interessava, e nunca permitiria que me insultassem ou condenassem.

Como condenar o Amor se é ele que nos torna melhores?

É no amor e no respeito pelo outro e pelas suas diferenças que me dou inteiro e me cumpro como homem.

Rejeito o preconceito, quase sempre gerado pelo medo e ignorância, porque seca, menoriza, amesquinha.

Rejeito a infâmia, a mentira, porque fétidas e cobardes.

Não sou, nem quero ser, bandeira de coisa alguma, apenas não me quero arrepender do que fiz do meu tempo quando este se tiver finado.

Nesse dia quero adormecer na almofada das alegrias que vivi. Não gosto de dias disto, daquilo e de mais aqueloutro, mas já que existem no calendário de muitas conveniências ao menos que sirvam para adubar a vida de Humanidade.

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