A Índia e eu. Sinto que há tanto para dizer sobre este assunto, que se torna desafiante fazê-lo em “breves linhas”.
A Índia é a minha segunda casa. Sinto-a como um lar precioso onde resgatei memórias viscerais, daquelas que já vêm no ADN ligadas à nossa verdadeira essência, e que por alguma razão as esquecemos, como quem abandona uma parte de si para depois as encontrar com um sentido muito mais profundo e valioso.
A Índia é a minha segunda casa.
Quando escrevo sobre este país, pode dar a sensação que o “decoro” como se de um mar de rosas se tratasse… não é de todo essa a minha intenção – passar uma imagem que não corresponde à verdade, mas aquilo que sinto é que cultura, os costumes, a pobreza nos desafiam, nos retiram da zona de conforto, nos dão verdadeiros murros no estômago que nos mostram que a maior parte das vezes, nos estamos a queixar de “barriga cheia”, pois temos tudo e nem sabemos…
O berço da espiritualidade.
Sempre que fui à Índia, fiquei dois ou mais meses, de forma a mergulhar nos profundos ensinamentos naquele que é, para mim, o berço da espiritualidade. E esses ensinamentos chegam-nos de todos os lados – através de pessoas que não têm nada e mesmo assim não perdem o sorriso, e te oferecem o “nada que têm”, através da substituição daquilo que é superficial pelo que é realmente importante e cheio de valor – quantas vezes estamos preocupados com o invólucro, com a aparência (refiro-me a aparência de tudo – restaurantes, pessoas, etc.) e através desse olhar viciado na superficialidade, perdemos o núcleo, o valor de algo que não se observa a olhos vistos?
A flexibilidade existe não só no corpo, mas acima de tudo na mente.
Na Índia todo o meu ser foi “desmontado”, saíram uma série de crenças, limitações, “exigências”, complicações, perfeições que queremos seguir que nos tornam ainda mais imperfeitos. Neste apaixonante e, para alguns, assustador país, aprendemos não só a enlouquecer conscientemente, mas também, que a flexibilidade existe não só no corpo, mas acima de tudo na mente. É apaixonante como este povo nos ensina de forma natural sobre o conceito de ser flexível, pois não só consegues entender verdadeiramente do que se trata, como o experiencias na pele, transformando assim, o teu conhecimento em sabedoria (uma vez que a sabedoria é o conhecimento aplicado).
A paz no meio do caos organizado.
Também aprendi que é possível encontrar a paz no meio do caos, que é possível existir um caos organizado. Exemplo disto é o trânsito na Índia – estamos sempre a ouvir buzinas, os carros não seguem as listas que se encontram pintadas na estrada, podemos ter quatro filas de carros, onde, para a nossa cabeça, só caberiam duas, mas mesmo nessa total e aparente confusão, eles sabem quando uma buzina indica se vai ultrapassar, se vai para a esquerda, se vai para a direita e a verdade é que não me recordo de ter visto um acidente no meio desta “desordenada e louca organização”.
Uma tremenda devoção a algo que é maior, infinito e não palpável.
Em termos espirituais, foi também aqui que percebi e experienciei o que significa realmente devoção. Uma coisa é eu estar a orar não sentindo as palavras que saem apenas da minha mente, outra é eu estar totalmente entregue a essa oração que vem de um lugar do coração e é acolhida pela mente, e, por isso, sentida por todo corpo, onde a certeza de que tudo está como tem de estar, e de que tudo vai acontecer no tempo certo é inabalável. Sentes dentro de ti uma tremenda devoção a algo que é maior, infinito e não palpável.
Para além disto, amei que os vários professores indianos que conheci desmontassem também a nossa mania dos “Porquê’s”. É incrível como para as mentes ocidentais tudo tem de ser explicado e tem de ter uma razão. Por exemplo, nas escolas onde pratiquei meditação, pura e simplesmente te transmitem as técnicas, e depois serás tu quem vai perceber onde essas técnicas te conduzem e o que te ensinam. Desta forma libertamo-nos do apego à mente, ao mesmo tempo que mergulhamos sem estarmos condicionados a explicações prévias. Para além de que se trata de um excelente treino este não querer uma explicação para tudo.
A Índia e eu.
Poderia descrever os locais onde já estive, as escolas por onde passei, os ashrams e templos onde meditei, mas a verdade é que quando penso na Índia, penso em todas as aprendizagens que este local me ofereceu, e como elas continuam a ser extremamente preciosas e necessárias para o meu dia a dia. São estas aprendizagens que definem a frase “A Índia e eu”.