A feira fazia-se às sextas

Cristina Santos Costa // Novembro 3, 2017
Partilhar

Todas as sextas se vai à feira. Há de tudo, ou quase tudo, porque no regresso se ouve sempre que a feira já não é o que era.

Em tempos a feira começava logo manhã cedo, o alvoroço levantava-se com a alvorada. Aquilo era a feira e o entusiasmo de uma festa, o encontro semanal de quem vem de longe e procura barato aquilo que não colhe no quintal, no terreno que ainda vai dando para pôr na mesa as batatas ou o feijão e as couves.

As mulheres mexem-se entre as barracas montadas a preceito regateando preços com os feirantes, sempre os mesmos: “venha cá pra semana que se não servir a gente troca”. E deitam conversa fora que os dias não foram feitos para grandes encontros e aquele é o dia feito para desenferrujar a língua.

Poucos são os homens que as acompanham. Esses já começam a juntar-se ao redor dos fogareiros, as febras a serem grelhadas, o fumo a erguer-se em rolos a atirar o cheiro das carnes e a abrir vontades de usar a navalha a cortar os nacos de pão a pingar o unto dos coiratos. E a terra batida a secar as gargantas a pedir o copinho de vinho a saciar a sede, a matar o vício.

Era assim a feira de panos e aventais e facas e navalhas e de boinas e os chapéus de abas para os domingos. Um grande centro de comércio tapado pelas lonas das barracas a protejer do sol castigador nos dias mais quentes.

E os artesãos, poucos que para ter artes é preciso que outros ganhem para a casa.

Era o caso daquele homem, a esconder o olhar debaixo da pala tão larga para fazer sombra que baste. Chamo-lhe senhor Joaquim que não estou certa do nome dado na pia baptismal. Fiquei ali presa entre as almotolias, os cântaros de folha e os cestos de verga, as cadeiras empalhadas e dois homens que sem freguesia iam falando das coisas da vida. E depois já éramos três eu a querer saber das artes, eles entusiasmados a ensinar os seus saberes.

E o sr. Joaquim, fazedor de cestos mostrava com mestria como fazer o entrançado das cadeiras de palha, sem vacilar, hábil, conversador que aqueles olhos mortiços que não viam não lhe tinham tirado a curiosidade de compreender o mundo. E de sorrir …

Social Media

Copyright © 2023 Simply Flow. Todos os direitos reservados.

Este site utiliza cookies para melhorar a sua experiência. Aceitar Saber mais